sábado, 3 de agosto de 2013

ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA

    
Celebração litúrgica: 15 de agosto.

 1.  “ Celebramos hoje a Assunção de Nossa Senhora, solenidade também conhecida como Nossa Senhora da Glória. Em Maria, aconteceu o grande sonho de Deus para todos nós: a realização plena do Mistério Pascal. A Assunção é a festa mais antiga em honra da Virgem, que nos recorda que, ao final de sua vida, ela foi elevada em corpo e alma à glória do céu.

  Podemos falar de uma glória terrena de Maria. Afinal, que outra criatura humana foi mais amada e invocada, mais retratada pelos artistas de todos os tempos e inspirou mais poetas e músicos ao longo da história? Tudo isso vem comprovar aquilo que o Espírito Santo já havia dito pelos seus lábios: “Todas as gerações me chamarão bem-aventurada.”
  Essa glória humana,no entanto, não tem comparação com a verdadeira glória de Maria, que é aquela que toda a Igreja, toda criatura humana, é chamada a ser: o louvor da glória de Deus. Maria é, pois o ícone escatológico da Igreja, ou seja, nela se antecipa aquilo que será a futura realização de todos nós. Em Maria realiza-se plenamente a expressão lapidar de Santo Irineu: “A glória de Deus é o homem vivo.”
  A liturgia deste dia começa com a visão da Arca da Aliança no alto dos céus, aponta Maria como a nova Arca da Aliança. Nós a encontramos a caminho, no deserto. Na pessoa de uma mãe que carrega em seu seio o Verbo Eterno feito Homem, o humano se faz portador do divino, o corpo se faz sacrário da divindade, e à sua voz o austero João Batista já dança de felicidade no ventre de Isabel, sentindo a presença no mistério escondido no seio da Virgem. Com sua assunção, não somente João Batista exulta – palavra latina que, em sua origem significa dar pulos de alegria -, mas também os coros dos anjos exultam como cantamos na antífona da entrada de hoje. Juntamente com eles, neste dia, contemplamos a glória da Mãe, a humanidade exulta celebrando a certeza do céu”.


    Referência: folheto da missa – Ano A – nº 49 – 21 de agosto de 2011.

A Palavra É... Assunção

   A Assunção de Nossa Senhora aos Céus é a grande solenidade litúrgica do mês de agosto. É celebrada no dia 15, mas no Brasil é celebrada no domingo seguinte. A solenidade da Assunção celebra a elevação de Maria em corpo e alma à eternidade para junto de Deus de forma definitiva.
   A palavra assunção tem a mesma raiz que a palavra assumir e, portanto, um significado semelhante. Assunção deriva do latim assumptionis, que significa “ação de tomar, de receber, de assumir algo, apropriar-se”.
   Não devemos confundir assunção com ascensão. São palavras com significados diferentes. Na assunção Maria foi sujeito passivo. A assunção é um ato de Deus. Deus elevou Maria ate o céu em corpo e alma. Na ascensão, Jesus foi ativo. À vista dos discípulos, se elevou ate o Pai. Maria foi elevada. Deus a tomou para junto de si.
   A assunção de Maria é um dos quatro dogmas marianos. Este dogma foi proclamado pelo Papa Pio XII, no dia 1º de novembro de 1950, na constituição Munificentissimus Deus (Generosíssimo Deus): “Declaramos e definimos ser dogma divinamente revelado que Maria Imaculada, mãe de Deus, sempre Virgem Maria, no fim do curso de sua vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à gloria do céu”.
   A declaração do dogma da Assunção está diretamente ligada a outro dogma: a Imaculada Conceição, promulgada por Pio IX, em 8 de dezembro de 1854. Nesse dogma, a Igreja afirma a santidade original de Maria. A Mãe de Jesus foi concebida em graça, e sem pecado original.
   Essa relação entre os dois dogmas é confirmada pelo Catecismo da Igreja Católica: “Finalmente, a Imaculada Virgem, preservada imune de toda mancha da culpa original, terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma a gloria celeste. E para que mais plenamente estivesse conforme a seu Filho, Senhor dos senhores e vencedor do pecado e da morte, foi exaltada pelo Senhor como rainha do universo. A assunção da Virgem Maria é uma participação singular na Ressurreição de seu Filho  e uma antecipação da ressurreição dos outros cristãos” (nº 966).
   Maria, diferente de nós, não precisou esperar o fim dos tempos para receber um corpo glorificado. O que para nós é uma meta a ser atingida, para a Virgem Maria já é uma realidade. Ela já está junto de Deus com seu corpo transformado, cheio de graça e luz. Deus a assumiu, a tomou para si. Transformou seu corpo, suas ações e sua história. Do céu, junto com seu Filho, intercede por cada um de nós.

Referencia: Revista mensal Ave Maria – Agosto de 2008 – p.44 – pelo Pe. Maciel M. Claro, cmf.

2.     A proclamação do dogma

  A assunção corporal da Bem-aventurada Virgem Maria foi definida como dogma de fé por Pio XII, em 1950. A definição afirma:

Pela autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo e pela nossa, proclamamos e definimos ser um dogma revelado por Deus que, quando a etapa de sua vida terrena terminou, a Imaculada Mãe de Deus, a sempre Virgem Maria, foi elevada de corpo e alma à glória do céu.1

  Essa proclamação nada diz sobre a morte de Maria, nem como ela morreu, mas cautelosamente fala sobre “quando a etapa de sua vida terrena terminou”. Pio XII fala de sua assunção (analepsis), não de sua dormição (koimesis):

  Era apropriado que o santíssimo corpo de Maria, o corpo que trouxe Deus, o receptáculo de Deus, que era divinizado, incorruptível, iluminado pela graça divina e cheio de glória... Fosse confiado a terra por pouco tempo e fosse elevado na glória para o céu, com sua alma suplicando a Deus.2
  A vida dela na terra terminou e sua dedicação a Jesus e ligação com ele, que começaram na encarnação, iniciaram a ultima etapa perfeita. Proclamar a assunção de Maria como dogma de fé é afirmar que ela agora participa da plenitude da ressurreição que Deus prometeu a todos os povos, quando ressuscitou Jesus dos mortos. Assim, a assunção de Maria depende totalmente da ressurreição de Cristo. Ela agora vive além da morte, além do julgamento, e a mesma gloria que agora ela goza é a que nós, pela misericórdia divina, esperamos finalmente gozar.
  Ao aludir às guerras sangrentas do século XX e ao aumento do materialismo, o decreto papal deplora como a destruição da vida e a profanação do corpo humano ameaça o sentido de nossa identidade dada por Deus. Ao oferecer Maria como nosso modelo, “o destino sublime de nossa alma e nosso corpo pode dessa maneira notável atrair a atenção de todos”. 3
 O Concílio Vaticano II enfatizou a unidade da glória corporal e espiritual de Maria no céu. A assunção “de corpo e alma” afirma que a pessoa toda será salva. A fé cristã afirma que, na ressurreição dos mortos, toda pessoa recebe um corpo transformado (não o cadáver que é deixado para trás) e é levada inteira à vida eterna, pois a alma não pode ser separada do corpo. Embora Maria fosse sem pecado, não ficou isenta da transformação final na morte. Em nossa busca da imortalidade, consideramos a morte um obstáculo a ser superado. Todavia a morte não é castigo; faz parte da vida humana que Deus deseja para a humanidade. O relacionamento entre a Igreja e a Virgem, assumida no céu, é enfatizado na Lumen Gentium:
  Nesse ínterim, a Mãe de Jesus, tal como está nos céus já glorificada de corpo e alma, é a imagem e o começo da Igreja como deverá ser consumada no tempo futuro. Assim também brilha aqui na terra como sinal de esperança segura e de conforto para o povo de Deus em peregrinação, até que chegue o dia do Senhor.4

   O Concílio Vaticano II exorta-nos a suplicar a Maria que interceda junto a Cristo, como fez nas primícias da Igreja, “até que a concórdia, no único povo de Deus, para a gloria da Santíssima e Indivisa Trindade”.5 Em sua assunção, Maria é sinal da futura realização da Igreja como conforto para nós peregrinos.
  Quando a assunção foi declarada dogma de fé, em 1950, muita gente receou que isso pudesse ser outro grande empecilho à unidade cristã. Por ironia, foi o psiquiatra protestante Carl Jung que explicou ser esse o acontecimento religioso mais importante em quatrocentos anos. Jung sentiu que uma visão universal materialista, combinada com o progresso ciência e da tecnologia, punha em perigo a herança espiritual da humanidade. A Igreja, disse ele, precisava de um símbolo feminino. Ele percebeu que a recente consciência da dignidade das mulheres precisava ser conscientemente reconhecida e receber expressão simbólica. Chegou a chamar Maria a “quarta pessoa” da Trindade. Aqui Jung não faz uma declaração teológica, nem incorpora Maria à divindade. Preocupa-se com o fato de que, ao elevar o feminino (muitas vezes projetado como símbolo do mal) no nível do divino, a Igreja estivesse fazendo poderosa declaração simbólica. Ver a mulher Maria coroada e gloriosa no céu era ver o feminino em uma nova luz.

   No corpo de Maria glorificada, a criação material começa a participar do corpo ressuscitado de Cristo. 6A assunção de Maria não só antecipa o corpo ressuscitado de todos os cristãos, mas o estado redimido do cosmos que no presente está sujeito à decomposição:
O estado do mundo material redimido por completo também precisa resplandecer em Maria como arquétipo da Igreja... o estado redimido do cosmo físico no fim dos tempos resplandece no corpo dela.7

Em um século que teve guerras terríveis, destruição maciça da vida humana e de centros de civilização, a exploração de nossa ecologia e a ameaça constante de guerra nuclear, a Igreja católica afirma que em uma mulher, Maria, Mãe de Deus, o sentido último de toda a realidade já está realizado. Sentimo-nos impotentes em meio à pobreza, à fome e à opressão que trazem a morte prematura a milhões de mulheres, homens e crianças. Entretanto, somos incentivados por desenvolvimentos como redes de solidariedade, e cuidados com nosso planeta Terra. São sinais de esperança em meio à injustiça e à opressão. A Imaculada Conceição e a assunção apontam para a realização final do Reino de Deus e nos incentivam a trabalhar pela transformação do presente enquanto aguardamos a plenitude do tempo, para reunir “todas as coisas, as que estão nos céus e as que estão na terra” (Ef 1, 10).

3.     O que diz o dogma da Assunção

  Nós cremos que a vida que Deus nos deu e nós cultivamos não termina com a morte. Jesus, o ressuscitado, nos garante que Deus oferecerá algo melhor: uma vida glorificada, em comunhão com a Trindade e com os nossos irmãos e irmãs.  Deus dá a todos a possibilidade de ressuscitar, de entrar na “vida eterna”. Como vai ser essa vida, a gente não sabe. Só sabemos que vai ser boa, muito melhor do que a atual.
  Os cristãos, no decorrer dos séculos, começaram a pensar como seriam essas últimas realidades depois da morte. Então, com a ajuda da Bíblia, da Filosofia e da Teologia, imaginaram assim: depois da morte, o corpo se separa da alma, temporariamente. A alma, que é a dimensão mais importante da pessoa, onde está sua identidade, vai para o encontro com Deus no “juízo particular”. Ali, ela vai apresentar tudo de bom (e de ruim) que realizou nessa vida. Se a pessoa está bem com Deus e com os outros, se seu coração está em “estado de graça”, então a alma gozará das alegrias eternas no céu.
  No fim dos tempos, Jesus vai voltar com gloria e poder. Será a parusia. Haverá também a ressurreição final dos mortos. Ou seja, cada um vai receber um corpo transformado, de acordo com a sua situação depois da morte. A alma volta a se unir ao corpo. Não esse corpo de carne e osso, que morre estraga, mas um corpo glorificado.
  Dento desse pensamento é que foi proclamado o dogma da Assunção. Maria, diferente de nós, não precisou esperar o fim dos tempos para receber um corpo glorificado. Depois de sua vida terrena, ela já está junto de Deus com o corpo transformado, cheio de graça e de luz.
  Hoje há outras maneiras de compreender a ressurreição dos mortos. O importante é a gente crer que Maria já esta glorificada junto de Deus, toda inteira. Ela antecipa o que está prometido para cada um de nós: participar do banquete da vida, trazendo consigo o amor e seus frutos.
  Não podemos entender ao pé da letra a assunção, como se Maria subisse ao céu com o corpo que ela possuía aqui na terra, com ossos, pele, carne, sangue. O corpo de Jesus ressuscitado e o de Maria assunta não são como o de Lázaro (Jo 11, 43-44) ou do filho da viúva de Naim (Lc 7, 13-15). Essas pessoas, mais cedo ou mais tarde, voltaram a morrer, e seus corpos provavelmente se estragaram. O corpo de Maria, ao contrario, foi transformado e assumido por Deus.
  A assunção de Maria deve ser compreendida em relação à ressurreição de Jesus. São Paulo nos diz que Jesus é o primeiro ressuscitado (Cl 1, 18; Rm 15, 20-22); e que nós os seguiremos. Os relatos dos evangelhos que falam sobre a ressurreição mostram que o Cristo ressuscitado é o mesmo Jesus, pois os discípulos podem comer com ele e tocar em seu corpo (Jo 2º, 27). Mas o corpo do ressuscitado é completamente diferente do nosso. As pessoas só podem reconhecer Jesus se têm fé nele (Jo 20, 14-16). Até seus discípulos não o identificam à primeira vista (Lc 24, 13-16). Jesus não é nenhum fantasma, mas entra na casa dos discípulos, estando às portas trancadas (Jo 20, 19). ComoJesus pode continuar o mesmo e ser tão diferente? Aí está uma das novidades da ressurreição. É uma forma de vida completamente nova, muito além do que podemos imaginar.
 Cremos que Maria está junto de Jesus, glorificada por inteiro. Deus assumiu e transformou toda sua historia, suas ações e seu corpo. E como ela está na gloria de Deus e dos santos, continua perto de nós, acompanhando-nos como mãe amorosa e companheira de fé.

4.     As lições do dogma para nós

   O dogma da assunção estimula a nossa fé, especialmente nos momentos de crise. Sabemos que Deus assumiu e transformou tudo de bom que Maria construiu aqui na terra, até o seu corpo. Olhando para Maria, ressuscitada e glorificada, que seguiu os passos de seu Filho Jesus, a gente se anima a lutar pelo bem, pela verdade e pela justiça. Mesmo que a incompreensão e o fracasso aparentemente sejam mais fortes, cremos na força de Deus, no poder de Cristo ressuscitado. Ele inaugura para nós o “Novo Céu e a Nova Terra”, onde Maria já está com os santos. Lá, Jesus ficará bem pertinho de nós. Vai enxugar as lágrimas dos nossos olhos. Não haverá nem morte, nem sofrimento. O Senhor fará nova todas às coisas e nos dará, gratuitamente, a fonte da água da vida (Ap 21, 1-7).
   A assunção de Maria foi o resultado do seu peregrinar nesse mundo. Cada vez que ela ia dando novos passos para seguir a Jesus, para buscar a vontade de Deus, o Senhor ia assumindo e transformando sua pessoa. Ate que chegou o momento final. Acontece algo parecido conosco. Na vida de fé, cada passo que nós damos corresponde, da parte de Deus, a nos acolher, tomar pela mão, assumir e transformar.
  
Conclusão

Cada dogma nos diz que Maria é uma pessoa humana como nós, mas muito especial. Mostra os segredos de sua pessoa, que a gente não percebe com um olhar superficial. Maria é como a terra virgem, cheia de viço, cheirosa, aberta para ser fecundada por Deus. Ao acolher o imenso dom de Deus, ela se torna a Mãe do Filho de Deus encarnado. E nos ensina a desenvolver os traços do amor de Mãe. Ela correspondeu sempre, com liberdade e generosidade. Maria é a mulher de Nazaré, mãe e educadora do Messias. Ela se torna a perfeita discípula de Jesus, que ouve a Palavra, medita e a põe em pratica. Age também como mãe da comunidade. Deus assume de tal maneira sua pessoa e sua missão, que Maria hoje está glorificada junto de seu Filho e dos santos, pela assunção. Toda de Deus e muito humana: eis o segredo dos dogmas sobre Maria. Um segredo que nos ajuda a ser mais autênticos seguidores de Jesus com ela.

  1 Pio XII. Muntificentissimus Deus. In Acta Apostolicae Sedis. 1950, 42: 757.  Veja a tradução inglesa em The Catholic Mind 1951, pp. 65-78. Doravante citado como MD.
2 MD. 754.
3 MD. 758.
4 Lumen Gentium. 68.
5Lumen Gentium. 68.
6 Lumen Gentium. 69.
7 Citadoem RUETHER, Rosemary Radford.Sexism and God-Talk.Boston, Beacon Press. 1983. p.151.

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