sábado, 25 de abril de 2015
OS ÚLTIMOS DIAS DA VIRGEM MARIA - SANTO EPIFANIO (310 OU 320- 403)
Santo Epifanio (+403) – Grande batalhador contra heresias.
Natural da Palestina, homem culto, foi superior de uma comunidade monástica em
Euleterópolis (Judéia) e depois Bispo de Salamina, na Ilha de Chipre, foi
defensor da Virgindade Perpétua de Maria
«Voltando-se o Senhor, viu o discípulo a quem amava e lhe
disse, a respeito de Maria: 'Eis aí tua Mãe'; e então à Mãe: 'Eis aí teu
filho'»(Jo 19,26).
Ora, se Maria tivesse filhos, ou se seu esposo ainda
estivesse vivo, por que o Senhor a confiaria a João, ou João a ela? Mas, e
também por que não a confiou a Pedro, a André, a Mateus, a Bartolomeu? Fê-lo a
João, por causa de sua virgindade. A ele foi que disse: "Eis aí tua mãe".
Não sendo mãe corporal de João, o Senhor queria significar
ser ela a mãe ou o princípio da virgindade: dela procedeu a Vida. Nesse intuito
dirigiu-se a João, que era estranho, que não era parente, a fim de indicar que
sua Mãe devia ser honrada. Dela, na verdade, o Senhor nascera quanto ao corpo;
sua encarnação não fora aparente, mas real. E se ela não fosse verdadeiramente
sua mãe, aquela de quem recebera a carne, e que o dera à luz, não se
preocuparia tanto em recomendá-la como a sempre Virgem. Sendo sua Mãe, não
admitia mancha alguma na sua honra e no admirável vaso de seu corpo.
Mas prossegue o Evangelho: "e a partir daquele momento,
o discípulo a levou consigo". Ora, se ela tivesse esposo, casa e filhos,
iria para o que era seu, não para o alheio.
Temo, porém, que isso de que falamos venha a ser deturpado
por alguns, no sentido de que pareça estimulá-los a manter as mulheres que
dizem companheiras e diletas - coisa que inventaram com péssima intenção.
Com efeito, ali (no caso de João e da Santíssima Virgem) tudo
foi disposto por uma providência especial, que tornava a situação desligada das
obrigações comuns que, conforme a lei de Deus, se devem observar. Aliás, depois
daquele momento em que João a levou consigo, não permaneceu ela longamente em
sua casa.
Se alguém julgar que estamos laborando em erro, pode
consultar a Sagrada Escritura, onde não achará a morte de Maria, nem se foi
morta ou não, se foi sepultada ou não. E quando João partiu para a Ásia, em
parte alguma está dito que tenha levado consigo a santa Virgem: sobre isso a
Escritura silencia totalmente, o que penso ocorrer por causa da grandeza
transcendente do prodígio, a fim de não induzir maior assombro às mentes.
Temo falar nisso e procuro impor-me silêncio a este
respeito. Porque não sei, na verdade, se podem achar indicações, ainda que
obscuras, sobre a incerta morte da santíssima e muito bem-aventurada Virgem.
Pois de um lado temos a palavra, proferida sobre ela: "uma espada
transpassará tua alma, para que sejam revelados os pensamentos de muitos corações"
(Lc 2,35). De outro lado, todavia, lemos no Apocalipse de João (Ap 12), que o
dragão avançou contra a mulher, quando dera à luz um varão; e que foram dadas a
ela asas de águia, de modo a ser transportada para o deserto, onde o dragão não
a alcançasse. Isso pode ter-se realizado nela. Embora eu não o afirme
totalmente. Nem digo que tenha ficado imortal nem posso afirmar que tenha
morrido. A Sagrada Escritura, transcendendo aqui a capacidade da mente humana,
deixa a coisa na incerteza, em atenção ao Vaso exímio e excelente, de sorte que
ninguém lhe atribua alguma sordidez própria da carne. Portanto, se ela morreu,
não sabemos. E mesmo que tivesse sido sepultada, jamais teve comércio carnal:
longe de nós essa blasfêmia! Quem ousaria, em furor de loucura, impor esse
opróbrio à santa Virgem, erguendo contra ela a voz, abrindo a boca para uma
afirmação assim nefanda, ao invés de lhe entoar louvores? Quem iria desonrar
assim o Vaso digno de toda honra?
Foi a ela que prefigurou Eva, ao receber o título, um tanto
misterioso, de mãe dos viventes (Gn 3,20). Sim, porque o recebeu depois de ter
escutado a palavra: "tu és terra e à terra hás de tornar", isto é,
depois do pecado.
Numa consideração exterior e aparente, dir-se-ia que de Eva
derivou a vida de todo o gênero humano, sobre a terra. Mas na verdade é de
Maria que deriva a verdadeira vida para o mundo, é ela que dá à luz o Vivente,
ela a Mãe dos viventes. Portanto, o título de "mãe dos viventes"
queria indicar, na sombra e na figura, Maria.
Com efeito, não se aplica, porventura, às duas mulheres
aquela palavra: "quem deu a sabedoria à mulher, quem lhe deu a ciência de
tecer?" (Jo 18,36)
Eva, a primeira mulher sábia, teceu vestes visíveis para
Adão, a quem despojara. Fora condenada ao trabalho. Já que tinha sido
responsável pela nudez dele, precisou confeccionar a veste que cobrisse essa
nudez externa, que cobrisse o corpo exposto aos sentidos.
A Maria, porém, coube vestir o cordeiro e ovelha; com cujo
esplendor e glória, como se fora uma lã, foi confeccionada sabiamente para nós
uma veste, na virtude de sua imortalidade.
Outra coisa, além disso, pode considerar-se em ambas - Eva e
Maria - digna de admiração. Eva trouxe ao gênero humano uma causa de morte, por
ela a morte entrou no orbe da terra; Maria trouxe uma causa de vida, por ela a
Vida se estendeu a nós. Pois o Filho de Deus veio a este mundo, para que "onde
abundara o delito, superabundasse a graça" (Rm 5,20). Onde a morte havia
chegado, chegou a vida, para tomar seu lugar; e aquele mesmo que nasceu da mulher
para ser nossa Vida haveria de expulsar a morte, introduzida pela mulher.
Quando ainda virgem, no paraíso, Eva desagradou a Deus, por
sua desobediência. Por isso mesmo, emanou da Virgem a obediência própria da
graça, depois que se anunciou o advento do Verbo revestido de corpo, o advento
da eterna Vida do Céu.
FONTE: patristicabrasil.blogspot.com.br
GOMES, C. F. Antologia dos Santos Padres. Ed. Paulinas - São
Paulo, 1979
ECCLES
sábado, 18 de abril de 2015
BEM AVENTURADA VIRGEM MARIA
Quem ama ardentemente alguma coisa costuma trazer seu nome
nos lábios e nela pensar noite e dia. Não se me censure, pois, se pronuncio
este terceiro panegírico da Mãe de meu Deus, como oferenda em honra de sua
partida. Isso não será favor para ela mas servirá a mim mesmo e a vós, aqui
presentes - divina e santa assembléia - como um manjar salutar que, nesta noite
sagrada, satisfaça nosso gosto espiritual. Estamos sofrendo, como sabeis, de
penúria de alimentos. Assim, improviso a refeição; se não é suntuosa nem digna
daquilo que no-Ia inspira, possa ao menos acalmar-nos a fome. Sim, não é Maria
que precisa de elogios, nós é que precisamos de sua glória. Um ser glorificado,
que glória pode receber ainda? A fonte da luz, como será iluminada ainda? É
pois para nós mesmos que fazemos a coroa. "Vivo eu, diz o Senhor, e glorificarei
os que me glorificam" (2 Sm 2, 30).
O vinho agrada sem dúvida, é deliciosa bebida, e o pão
alimento nutritivo: um alegra, o outro fortifica o coração do homem (Sl 104,
15). Mas que existe de mais suave do que a Mãe de meu Deus? Ela cativou meu
espírito, ela reina sobre minha palavra, dia e noite sua imagem me é presente.
Mãe do Verbo, dá-me de que falar! Filha de mãe estéril, torna fecundas as almas
estéreis! Eis aquela cuja festa celebramos hoje em sua santa e divina Assunção.
Acorrei, pois, e subamos a montanha mística. Ultrapassando
as imagens da vida presente e da matéria, penetrando na treva divina e
incompreensível, ingressando na luz de Deus, celebremos o seu infinito poder.
Aquele que, de sua transcendência super-essencial e imaterial, desceu ao seio
virgíneo para ser concebido e se encarnar, sem deixar o seio do Pai; aquele que
através da Paixão marchou voluntariamente para a morte, conquistando pela morte
a imortalidade e voltando ao Pai; como não pôde ele atrair ao Pai sua Mãe
segundo a carne? Como não elevaria da terra ao céu aquela que fora um
verdadeiro céu sobre a terra?
Hoje a escada espiritual e viva, pela qual o Altíssimo
desceu, se fez visível e conversou entre os homens (Baruc 3, 38), ei-la que
sobe, pelos degraus da morte, da terra ao céu. Hoje a mesa terrestre que, sem
núpcias, trouxera o pão celeste da vida e a brasa da divindade, foi levada da
terra aos céus, e para a Porta oriental, para a Porta de Deus, se ergueram as
portas do céu.
Hoje, da Jerusalém terrestre, a Cidade viva de Deus foi
conduzida à Jerusalém do alto; aquela que concebera como seu primogênito e
unigênito o Primogênito de te da criatura e o Unigênito do Pai, vem habitar na
Igreja das primícias (Hb 12, 23); a arca do Senhor, viva e racional, é
transportada ao repouso de seu Filho (Sl 132, 8).
As portas do paraíso se abrem para acolher a terra portadora
de Deus, onde germinou a árvore da vida eterna, redentora da desobediência de
Eva e da morte infligida a Adão. É o Cristo, causa da vida universal, quem
recebe a gruta escondida, a montanha não trabalhada, donde se destacou, sem
intervenção humana, a pedra que enche a terra.
Aquela que foi o leito nupcial onde se deu a divina
encarnação do Verbo, veio repousar em túmulo glorioso, como em tálamo nupcial,
para de lá se elevar até a câmara das núpcias celestes, onde reina em plena luz
com seu Filho e seu Deus, deixando-nos também como lugar de núpcias seu túmulo
sobre a terra. Lugar de núpcias, esse túmulo? Sim, e o mais esplendoroso de
todos, a refulgir não por revérberos de ouro, de prata ou de gemas, porém pela
divina luz, irradiação de Espírito Santo. Proporciona, não uma união conjugal
aos esposes da terra, mas a vida santa às almas que se prendem pelos laços do
Espírito, proporciona uma condição junto de Deus, melhor e mais suave que outra
qualquer.
Seu túmulo é mais gracioso do que o Éden: neste, sem
querermos repetir tudo o que lá se passou, houve a sedução do inimigo, sua
mentira apresentada como conselho amigo, a fraqueza de Eva, sua credulidade, o
engodo - doce e amargo - ao qual seu espírito se deixou prender e pelo qual em
seguida aliciou o marido; a desobediência, a expulsão, a morte, mas - para não
trazermos com tais lembranças assunto de tristeza à nossa festa - houve o
túmulo que elevou ao céu o corpo de um mortal, ao contrário daquele primeiro
jardim, que derrubou do céu nosso primeiro pai. Pois não foi ali que o homem,
feito à imagem divina, ouviu a sentença: "tu és terra e em terra te hás de
tornar"? (Gn 3, 19).
O túmulo de Maria, mais precioso que o antigo tabernáculo,
encerrou o candelabro espiritual e vivo, brilhante de divina luz, a mesa
portadora de vida, que recebeu, não os pães da proposição, mas o pão celeste,
não o fogo material mas o fogo imaterial da divindade.
Esse túmulo é mais feliz que a arca mosaica, pois teve por
partilha a verdade, já não as sombras e as figuras; acolheu a urna áurea do
maná celeste, a mesa viva do Verbo encarnado por obra do Espírito Santo, dedo
onipotente de Deus, Verbo subsistente; acolheu o altar dos perfumes, a brasa
divina que aromatizou toda a Criação.
Fujam, portanto os demônios, gemam os míseros nestorianos -
como outrora os egípcios - com seu chefe, o novo faraó, o cruel flagelo, o
tirano, pois foram engolidos pelo abismo da blasfêmia. Nós, porém, salvos, que
atravessamos a pé enxuto o mar da impiedade, cantemos à Mãe de Deus o canto do
Êxodo. Miriam, que é a Igreja, tome nas mãos o tamborim e entoe o hino de festa;
saiam as jovens do Israel espiritual com tamborins e coros (Ex 15, 20),
exultando de alegria! Que os reis da terra, os juízes e os príncipes, os jovens
e as virgens, os velhos e as crianças, celebrem a Mãe de Deus! Que reuniões e
discursos de toda espécie, raças e povos na diversidade de suas línguas,
componham um cântico novo! Que o ar ressoe de flautas e trombetas espirituais,
inaugurando com brilho de fogos o dia da salvação! Alegrai-vos, ó céus, e vós,
nuvens, fazei chover a alegria! Saltai, novilhos do rebanho eleito, apóstolos
divinos que, como montanhas altas e sublimes, aspirais às mais altas
contemplações; e vós, também, ó cordeiros de Deus, povo santo, filhos da
Igreja, que pelo desejo vos alçais como colinas até as altas montanhas!
Mas então? Morreu a fonte da vida, a Mãe de meu Senhor? Sim,
era preciso que o ser formado da terra à terra voltasse, para dali subir ao
céu, recebendo o dom da vida perfeita e pura a partir da terra, após ter-lhe
entregue seu corpo. Era preciso que, como o ouro no crisol, a carne rejeitasse
o peso da mortalidade e se tornasse, pela morte, incorruptível, pura, e assim
ressuscitasse do túmulo.
Começa hoje para Maria uma segunda existência, recebida
daquele que a fez nascer para a primeira, como também ela mesma dera uma
segunda existência - a vida corpórea - àquele, cuja primeira existência, a
eterna, não teve começo no tempo, embora principiada no Pai como em sua divina
causa.
Alegra-te, Sião, montanha divina e santa, onde habitou a
outra montanha divina, a montanha vivente, a nova Betel, ungida na pedra, a
natureza humana ungida pela divindade. De ti, como de um jardim de oliveiras, e
Filho se elevou às celestes alturas. Que uma nuvem se componha, universal e
cósmica, e que as asas dos ventos tragam os apóstolos dos confins da terra até
Sião!1 Quem são aqueles que, como nuvens e águias, voam para o corpo - fonte de
toda ressurreição, a fim de cultuar a Mãe de Deus? Quem é a que sobe, na flor
de sua alvura, toda bela, brilhante como o sol? Que cantem as cítaras do Espírito,
isto é, as línguas dos apóstolos! Que ressoem os címbalos, isto é, os arautos
eminentes da palavra de Deus! Que esse vaso de eleição, Hieroteu 2, santificado
pelo Espírito Santo e pela união divina capacitado a sofrer as realidades
divinas, seja arrebatado do corpo, e em transportes de fervor entoe seus hinos!
Que todas as nações aplaudam e celebrem a Mãe de Deus! Que os anjos prestem
culto ao corpo mortal!
Filhas de Jerusalém, feitas cortejo da Rainha, e virgens
suas companheiras, ide com ela até o Esposo, levai-a à direita do Senhor!
Desce, ó Soberano, vem pagar à tua Mãe a dívida que ela merece por te haver
nutrido! Abre tuas mãos divinas e acolhe a alma de tua mãe, tu que sobre a cruz
entregaste o espírito às mãos do Pai! Dirige-lhe um suave apelo: vem, ó
formosa, ó bem-amada, mais resplandecente pela virgindade do que o sol, tu me
partilhaste teus bens, vem agora gozar junto de mim o que te pertence!
Aproxima-te, ó Mãe, de teu Filhe, aproxima-te e participa do
poder régio daquele que, nascido de ti, contigo viveu na pobreza! Ascende, ó
Soberana, ascende! Já não vale a ordem dada a Moisés: "Sobe e
morre..." (Dn 31, 48) Morre, sim, mas eleva-te pela própria morte! Entrega
tua alma às mãos de teu Filho e devolve à terra o que é da terra, pois mesmo
isso será carregado por ti.
Erguei vossos olhos, Povo de Deus, alçai vosso olhar! Eis em
Sião a arca do Senhor Deus dos exércitos, à qual vieram pessoalmente prestar
assistência os apóstolos, tributando seu derradeiro culto ao corpo que foi
princípio de vida e receptáculo de Deus. Imaterialmente e invisivelmente os
anjos o cercam com respeito, como servidores da Mãe de seu Senhor. O próprio
Senhor lá está, onipresente, ele que tudo enche e abraça, que na verdade não
está em lugar algum porque nele tudo está como na causa que tudo criou e tudo
encerra.
Eis a Virgem, filha de Adão e Mãe de Deus: por causa de Adão
entrega seu corpo à terra, mas por causa de seu Filho eleva a alma aos
tabernáculos celestes! Santificada seja a Cidade santa, que acolhe mais essa
bênção eterna! Que os anjos precedam a passagem da divina morada e preparem seu
túmulo, que o fulgor do Espírito a decore! Preparai aromas para embalsamar o
corpo imaculado e repleto de delicioso perfume! Desça uma onda pura a fim de
haurir a bênção da fonte imaculada da bênção! Alegre-se a terra de receber o
corpo e exulte o espaço pela ascensão do espírito! Soprem as brisas, suaves
como o orvalho e cheias de graça! Que toda a criação celebre a subida da Mãe de
Deus: os grupos de jovens em sua alegria, a boca dos oradores em seus
panegíricos, o coração dos sábios em suas dissertações sobre essa maravilha, os
velhos de veneráveis cãs em suas contemplações. Que todas as criaturas se
associem nessa homenagem, que ainda assim não seria suficiente. Todos, pois,
deixemos em espírito este mundo com aquela que dele parte. Sim, todos, pelo
fervor do coração, desçamos com a que desce à sepultura e ali nos coloquemos.
Cantemos hinos sacros e nossas melodias se inspirem nas palavras: "Ave,
cheia de graça, o Senhor é contigo!" Permanece na alegria, tu que foste
predestinada a ser Mãe de Deus. Permanece na alegria, tu que foste eleita antes
dos séculos por um desígnio de Deus, germe divino da terra, habitação do fogo
celeste, obra-prima do Espírito Santo, fonte de água viva, paraíso da árvore da
vida, ramo vivo que portas o divino fruto, donde fluem o néctar e a ambrosia,
rio de aromas do Espírito, terra produtora da divina espiga, rosa
resplandecente da virgindade, donde emana o perfume da graça, lírio da veste
real, ovelha que geras o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo,
instrumento de nossa salvação, superior às potências angélicas, serva e Mãe!
Vinde, enfileiremo-nos em torno ao túmulo imaculado para
dali sorvermos a divina graça! Vinde, abracemos em espírito o corpo virginal.
Entremos no sepulcro e morramos nele, rejeitando as paixões da carne, vivendo
uma vida sem concupiscência e sem mácula. Escutemos os hinos divinos, cantados
imaterialmente pelos anjos. Entremos para adorar, aprendamos a conhecer o mistério
inaudito: como esse corpo foi elevado às alturas, arrebatado ao céu, como a
Virgem foi posta junto de seu Filho acima dos coros angélicos, de sorte que
nada se interpusesse entre Mãe e Filho.
Tal é, depois de outros dois, o terceiro discurso que compus
acerca de tua partida, ó Mãe de Deus, em honra e amor da Trindade, cuja
cooperadora foste, por benevolência do Pai e por virtude do Espírito, quando
recebeste o Verbo sem princípio, a Sabedoria onipotente, a Força de Deus.
Aceita, pois, minha boa vontade, maior do que minha capacidade, e dá-me a
salvação, a libertação das paixões da alma, o alívio das doenças dos corpos, a
salvação das dificuldades, a vida de paz, a luz do Espírito. Inflama nosso amor
por teu Filho, regula nossa conduta sobre o que lhe apraz, a fim de que, na
posse da bem-aventurança do alto, e vendo-te refulgir com a glória de teu
Filho, façamos ressoar hinos sagrados, na eterna alegria, na assembléia dos que
celebram, em festa digna do Espírito, aquele que por ti opera nossa salvação, o
Cristo Filho de Deus e nosso Deus, a quem pertence a glória e o poder, com o
Pai sem princípio e o Espírito Santo e vivificador, agora e sempre pelos
séculos. Amém.
NOTAS:
1 - O autor passa a aludir aqui a tradição, segundo a qual
Nossa Senhora, ao morrer em Jerusalém, teve à sua volta os apóstolos.
2. O autor pensa em Hieroteu, apresentado como mestre de
Dionísio em seu livro "Os Nomes Divinos".
Gomes, Folch. "Antologia dos Santos Padres". Ed.
Paulinas, 1979.
Fonte: http://www.ecclesia.com.br
sábado, 11 de abril de 2015
O ÍCONE DE LYDDA
A Sé Titular
da Palestina Prima no Patriarcado de Jerusalém, Lydda é chamada atualmente de
Lod. Lod (em grego Lydda) é uma cidade da Palestina, na Planície de Sharon, a
sudoeste de Jafa. Dista cerca de 20 quilômetros de Jope, na estrada para o
porto de Jerusalém. Seu padroeiro é São Jorge, pois acredita-se que o santo
tenha nascido lá.
Foi fundada
por Samad, da tribo de Benjamim, conforme relatam as Sagradas Escrituras (1Cr
8,12). Tempos depois, alguns de seus habitantes foram capturados e levados a
Babilônia, depois retornando os sobreviventes (Esd 2,33; Ne 7,37; 11,34). Em
meados do século II a.C a cidade foi dada pelos reis da Síria aos Macabeus
(1Mac 11,34.57). O imperador Júlio César deu Lod aos judeus em 48 a.C. A cidade
teve guerras civis durante a revolta dos judeus contra Roma no primeiro século
da Era Cristã.
Os primeiros
cristãos da cidade foram visitados pelo próprio Pedro, cura o paralítico
Enéias, segundo o Novo Testamento (At 9,32,35,38).
Seu primeiro
Bispo foi Aécio, amigo de Ário, este heresiarca do Arianismo. O título
episcopal de Lydda ainda existe no Patriarcado Grego de Jerusalém.
O peregrino
Teodósio fez a primeira menção da tumba de São Jorge em Lod no ano de 530, o
que a tornou tão famosa que a cidade teve o nome de Georgiopolis (do grego
“Cidade de Jorge”). Foi erguida uma magnífica igreja sobre o túmulo do mártir,
sendo reconstruída pelos Cruzados. Ainda se mantém até hoje pela Igreja Grega.
Com a chegada dos Cruzados em 1099, Lod se tornou uma Sé católica. O papa Bento
XVI visitou o local, onde celebrou a Liturgia com os Padres Orientais.
Existe
uma tradição que remonta ao tempo da heresia Iconoclasta e que narra a história
do Ìcone de Lydda, uma história impregnada de deslumbramento.
Quando
Pedro e João converteram numerosas pessoas, em Lydda, lá erigiram uma igreja,
consagrada à Mãe de Deus, e pediram à Virgem Maria que a visitasse,
abençoando-a com a sua presença. Mas a Mãe de Deus lhes respondeu: “Ide com
alegria, eu estarei convosco!”
Quando os
apóstolos chegaram à Igreja de Lydda, encontraram sobre uma das colunas a
imagem da Mãe de Deus, feita milagrosamente, sem a ação de “mãos humanas”. Mais
tarde, a Virgem Maria, em pessoa, visitou a Igreja, abençoou a imagem e
conferiu-lhe a graça de realizar milagres.
No século
IV, a imagem foi ameaçada pelo Imperador Juliano, “o Apóstata”, que enviou
pedreiros com a ordem de destrui-la. Porém, esta resistiu aos golpes dos
cinzéis. O fato milagroso deu origem à grande afluência de peregrinos vindos de
todo o Oriente.
Nas
vésperas da Revolta Iconoclasta, São Germano de Constantinopla, ainda monge da
Palestina, desejava muito ver o ícone de Lydda antes de partir para
Constantinopla, onde ele seria eleito o famoso patriarca. Para ter a Virgem de
Lydda sempre perto de si, São Germano pediu a um artista que fizesse uma cópia
da imagem, e levou-a. Em 725, o imperador Leão III2, desencadeou a destruição
dos ícones. O patriarca São Germano foi expulso da Sede Episcopal e viu-se
obrigado a deixar a capital. Antes de seu embarque escreveu uma carta ao Papa
São Gregório Magno, fixando a missiva sobre o ícone que confiou às ondas do
mar. O ícone navegou, ereto, até Roma, aonde chegou em apenas um dia.
Como o
Patriarca São José, sendo avisado em sonho, o Pontífice acompanhado pelo Clero
romano, acolheu a imagem flutuante às margens do rio Tibre. Quando o Papa terminou
sua oração, o ícone se ergueu sozinho, colocando-se entre as suas mãos. Levado
em procissão até a Basílica de São Pedro foi exposto à veneração dos fiéis.
Quando São
Germano compreendeu que a perseguição duraria muito tempo, ainda, enviou outro
ícone da Mãe de Deus, da mesma forma, através das águas do mar. E o segundo
ícone foi, igualmente, recebido pelo Santo Padre em Roma. Os dois ícones
permaneceram na Cidade Eterna por mais de um século.
Durante
Ofício celebrado pelo Papa Sérgio II (844-847), o ícone começou a se mover. O
povo, assustado com o fenômeno, cantou: “Kyrie Eleison”3 e o ícone se
imobilizou. Em seguida, levantou-se e, deixando a Igreja, dirigiu-se até o rio
Tibre, sendo seguido pelo Santo Padre e pelo povo.
Da mesma forma que chegara, no século
precedente, a imagem da Virgem Mãe afastou-se, mar afora, chegando a
Constantinopla, onde foi recebida pelo Patriarca Metódio, o Confessor. Quando
chegou a carta expedida por Roma que explicava o fato, notou-se, com grande
surpresa, que o ícone havia efetuado o trajeto em um único dia. A imagem foi
transferida solenemente para a Igreja de Chalkopratia, onde passou a ser
venerada com o título de “A Romana”.
Referência bibliográfica:
1- Iconoclastia (do grego εικών, transl. eikon,
"ícone", imagem, e κλαστειν, transl. klastein, "quebrar"=
"quebrador de imagem") era um movimento político-religioso contra a
veneração de ícones e imagens religiosas no Império Bizantino no início século
VIII e perdurou até o século IX. Os iconoclastas acreditavam que as imagens
sacras seriam ídolos, e a veneração e o culto de ícones por conseqüência,
idolatria.
2- Leão, o Isáurico (717-741), militar enérgico, imperador
bizantino; nasceu em Síria Comagena; derrubou o último monarca da dinastia
Heracliana e tomou o poder. Intolerante religioso, Leão III combateu o culto às
imagens (movimento iconoclasta), procurando enfraquecer o poder dos mosteiros.
Leão e seu filho Constantino V fecharam conventos, confiscaram bens do clero,
realizaram desfiles ridículos de monges no hipódromo.
3- Kyrie eleison (em grego: Κύριε ελέησον, transl. Kýrie
eléison, "Senhor, tende piedade") é uma oração liturgica. O
testemunho mais antigo de seu uso litúrgico remonta ao século IV, na igreja de
Jerusalém, e, no século V. Kyrie é o vocativo da palavra grega κύριος (transl.
kyrios, "Senhor"), traduzido livremente como "ó, Senhor",
enquanto eleison (ελεησον) é o imperativo aoristo do verbo eleéo (ελεεω;
"ter piedade", "compadecer-se"). É originário do salmo
penitencial 51 (50 na versão LXX). No Rito Romano na Forma Extraordinária o
Kyrie é recitado depois do ato penitencial; no Rito Ambrosiano é recitado
durante o ato penitencial, e repetido três vezes ao fim da Missa, antes da
bênção final. O Kyrie, por ser geralmente abreviado, faz parte também da missa
cantada, formando a parte que se segue ao intróito. O Kyrie foi substituído, no
Rito Romano Ordinário, pela invocação "Senhor, tende piedade."
4- CORBON, Jean, in “L'inculturation de la foi chrétienne au
moyen-orient” (A incultura da fé cristã em todo o Oriente Médio), Proche orient
chrétien (Oriente Médio cristão) ─ Volume 28, Fasc. 3-4. 1988. ( http://livrosmarianos.blogspot.com.br/2011/03/o-icone-de-lydda.html).
Assinar:
Postagens (Atom)