sábado, 29 de novembro de 2014

MARIA EM GRAÇA CONCEBIDA


Já no primeiro instante de sua concepção, Maria Santíssima foi enriquecida com uma plenitude de graças superior à de todos os Anjos e Santos reunidos. Luz tênue, igreja praticamente vazia, pouco ruído. É fim de tarde na cidade de Granada. Num confessionário, um sacerdote reza seu Breviário, enquanto permanece à disposição de qualquer fiel desejoso de purificar sua alma. Um jovenzinho se aproxima e ajoelha-se frente a frente com o ministro de Deus, como acontece normalmente com esse povo categórico. Sem dúvida alguma, ele queria confessar-se.
- Ave Maria puríssima! – disse o padre, segundo o costume ali vigente.
- Sem pecado concebida! – respondeu sem hesitar o penitente, tal como fazia desde sua infância. Entretanto, o confessor o corrigiu com a característica ênfase ibérica:
- Não! Deves responder-me: “Em graça concebida!”.
Esse pequeno episódio revela uma importante verdade teológica, e a frase do sacerdote encerra um belo louvor à Mãe de Deus. A maior plenitude concebível abaixo de Deus.
Voltemos nossa atenção para um século e meio atrás, aos 8 de dezembro de 1854. Foi nesse dia que o Beato Pio IX, falando ex cathedra, declarava ter sido a Bem-Aventurada Virgem Maria “preservada imune  de toda mancha do pecado original” 1 por singular graça e privilégio de Deus. Proclamava assim, perante o regozijo do orbe cristão, que a doutrina da Imaculada Conceição “foi revelada por Deus, e por isto deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis”. Sublime prerrogativa esta, a de ser preservada de toda mancha! Contudo, se analisarmos mais detidamente, veremos que nessas palavras se encerra não só o aspecto negativo do dogma – ter sido Ela concebida sem pecado – mas também, necessariamente, o aspecto positivo dessa mesma realidade: Maria foi concebida em graça e, como afirma o Concílio Vaticano II, foi “enriquecida, desde o primeiro instante da sua Conceição, com os esplendores duma santidade singular”.3
O Espírito Santo habitou n’Ela desde o início de sua existência, enchendo-A de seus dons, virtudes e carismas com tanta abundância, conforme ensina o Beato Pio IX: “Ela possui tal plenitude de inocência e de santidade que, depois da de Deus, não se pode conceber outra maior”.4 Desde o primeiro instante de sua Imaculada Conceição. É a essa plenitude de graças que faz referência o Arcanjo Gabriel na sua saudação: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo” (Lc 1, 28).
Enganar-se-ia quem objetasse que o fato de Maria Santíssima estar repleta de graças não significa que já o estivesse antes do anúncio do Anjo. Portanto A imaginasse como uma moça boazinha, com suas falhas e defeitos, que foi repentinamente tomada pelo Espírito Santo no momento da aparição de São Gabriel. Essa hipótese, entretanto, repugna o nosso senso católico e contradiz os princípios da Mariologia, pois, conforme explica umview renomado teólogo do século XX, a doutrina de que a graça inicial de Maria Santíssima fosse superior à de todos os Anjos e Santos reunidos é “completamente certa em Teologia”. Para explicar essa afirmação, outro teólogo contemporâneo aduz diversos argumentos, entre os quais o seguinte: “Como o ser preservada de pecado, não é outra coisa senão possuir a graça santificante desde o princípio da existência, e como Maria foi preservada de modo singularíssimo do pecado original, segue-se claramente que desde o princípio esteve cheia de graça”.
Especialmente esclarecedora é a explicação de São Tomás. Argumenta ele que “quanto mais próximo está alguém do princípio, seja qual for o gênero, mais participa de seu efeito”.7 Ou seja, assim como quem se coloca mais perto do fogo mais se aquece, quanto mais uma alma se aproxima de Deus tanto mais participa de seus dons. E conclui: “Ora, a Bem-Aventurada Virgem Maria foi a que esteve mais próxima de Cristo segundo a humanidade, pois foi d’Ela que Cristo recebeu a natureza humana. Eis por que Ela tinha de obter de Cristo uma plenitude de graça maior do que as outras pessoas”. É justamente essa proximidade de Cristo, pela sua predestinação como Mãe de Deus, que explica a plenitude de graças de Maria Santíssima desde o primeiro instante de sua Conceição.

Tríplice plenitude de graça
Evidentemente, a plenitude de graça em Maria não é idêntica à de seu Filho. Em Cristo, Autor da graça, ela é absoluta; portanto, sem possibilidade de aumento. Em Nossa Senhora, porém, é relativa e suscetível de crescimento, na medida em que aumentava a capacidade da sua alma, de algum modo unida à ordem hipostática. Segundo alguns teólogos, Maria crescia em graça até durante o sono, pois Ela possuía a ciência infusa, e esta continua funcionando quando a pessoa adormece.
Na realidade, com base no Doutor Angélico, não deveríamos falar da plenitude de graça de Maria, mais sim de uma tríplice plenitude vinculada ao privilégio da maternidade divina: a dispositiva, concedida no instante de sua concepção, com vistas a torná-La idônea a ser a Mãe de Cristo; a perfectiva, no momento da Encarnação do Verbo, quando Ela recebeu um imenso acréscimo de graça santificante; e a final ou consumativa, ou seja, a que a alma possui na glória celestial.

A morada que Deus preparou para Si
Dizia o Doutor Melífluo que De Maria nunquam satis – d’Ela não há o que baste. Pois Deus depositou na Virgem Maria todas as perfeições que era possível uma mera criatura ter. Ela transcende todos os Santos, como o Céu transcende a Terra. Ela é a montanha preferida por Deus, para habitar no tempo e na eternidade. Em louvor a Ela, canta o Salmista: “Montes escarpados, por que invejais a montanha que Deus escolheu para morar, para nela estabelecer uma habitação eterna?” (Sl 67, 17). Quão bela, santa e perfeita morada preparou Cristo Senhor para Si! Quão sublime e magnífica a Mãe que Ele deu para nós!

                                                      Por  Diácono. Felipe García López Ria, EP

Fonte: Revista Arautos do Evangelho, Julho/2014,. 151, p. 36-37



sábado, 22 de novembro de 2014

APRESENTAÇÃO DE NOSSA SENHORA


      Celebração do dia 21 de Novembro o episódio da apresentação de Maria no templo, não é narrado nas Sagradas Escrituras, mas em evangelhos apócrifos, em particular no Proto-evangelho de são Tiago, que a Igreja não considera inspirado por Deus.
    No entanto, a celebração deste dia é antiga. Era celebrada já no século VI em Jerusalém, e a Igreja do Oriente, que acolheu e conservou zelosamente as tradicionais festas marianas, reserva à apresentação de Maria uma memória particular, como um dos mistérios da vida daquela que Deus escolheu para Mãe de seu Unigênito.

        A Igreja do Ocidente, ao manter essa festividade também com a reforma do calendário litúrgico, entendeu praticar um gesto “ecumênico”.
      Na Liturgia das Horas, lê-se: “Neste dia da solene consagração da igreja de Santa Maria Nova, construída junto ao templo de Jerusalém, celebramos com os cristãos do Oriente aquela consagração que Maria fez a Deus de si mesma desde a infância, movida pelo Espírito Santo, de cuja graça ficara plena na sua imaculada conceição”.
       Se bem que não se encontre na tradição hebraica a oferta de meninas ao templo (e menos ainda na tenra idade de três anos, como se lê nos apócrifos, segundo os quais “Maria morou no templo do Senhor como uma pomba, recebendo o alimento das mãos de um anjo”), os cristãos celebram hoje aquele particular oferecimento de Maria a Deus, feito no segredo de sua alma, que a preparou para acolher o Filho de Deus.
     Esta menininha — diz são Germano de Constantinopla na homilia sobre a Apresentação — prepara o aposento para acolher a Deus, “mas não é o templo que a santifica e purifica, e sim a sua presença que purifica inteiramente o templo”.


                Por  Dom Julio Endi Akamine – Bispo de região Lapa – São Paulo

sábado, 15 de novembro de 2014

MARIA É NECESSÁRIA PARA A NOSSA SALVAÇÃO


§43. Se a Devoção à Santíssima Virgem é necessária a todos os homens simplesmente para conseguirem a salvação, o é ainda muito mais àqueles que são chamados a uma perfeição particular.
- Não creio mesmo que alguém possa atingir uma íntima união com Deus e uma perfeita fidelidade ao Espírito Santo, sem uma união muito grande com a Santíssima Virgem e sem uma grande dependência do seu patrocínio.
§44. Só Maria encontrou graça diante de Deus sem o auxílio de qualquer outra criatura (Lc 1, 30).
- Todos os que acharam graça diante de Deus desde então, só por seu intermédio a acharam, e também só por Ela a encontrarão todos os que ainda hão de vir. Maria estava cheia de graça ao ser saudada pelo arcanjo São Gabriel (Lc 1, 28), e recebeu uma plenitude superabundante de graça quando o Espírito Santo a cobriu com a sua sombra inefável (Lc 1, 35).
- De tal modo essa dupla plenitude foi aumentando dia a dia, momento a momento, que a sua alma atingiu um grau imenso e inconcebível de graça.
- Por isso o Altíssimo a fez única tesoureira dos Seus tesouros e única dispensadora das suas graças, para que Ela enobrecer, elevar e enriquecer a quem lhe aprouver, possa fazer entrar no caminho estreito do Céu quem Ela quiser, para fazer passar, apesar de tudo, quem Ela quiser pela porta estreita da vida, e para dar a quem Ela entender o trono, o cetro e a coroa de rei.
- Jesus é, em toda a parte e sempre, o fruto e o filho de Maria; e Maria é, por toda a parte, a verdadeira árvore que dá o fruto da vida, e a verdadeira mãe que o produz.
§45. Só a Maria confiou Deus as chaves dos celeiros do Divino Amor (Ct 1, 3) e o poder de entrar nos caminhos mais sublimes e mais secretos da perfeição, bem como de neles fazer entrar os outros.
- Só Maria dá aos miseráveis filhos da infiel Eva a entrada no Paraíso Terrestre para aí passearem aprazivelmente com Deus (Gn 3, 8), para aí se esconderem dos seus inimigos, para aí comerem o alimento delicioso - já sem temer a morte - do fruto das árvores da vida e da ciência do bem e do mal, e beberem a grandes tragos as celestes águas da bela fonte que aí jorra abundantemente. Ou melhor, visto ser Ela própria esse Paraíso Terrestre, essa Terra virgem e abençoada de onde Adão e Eva culpados foram expulsos, só acolhe em si aqueles e aquelas que lhe apraz, para os tornar santos.
§46. “Todos os ricos do povo” (Sl 44, 13) - para me servir da expressão do Espírito Santo, segundo a explicação de São Bernardo - “suplicarão a Vossa face pelos séculos afora” e especialmente no fim do mundo. Isto é, os maiores santos, as almas mais ricas em graça e em virtudes serão as mais assíduas em orar à Santíssima Virgem e em a ter sempre presente, como o perfeito modelo que desejam imitar e o poderoso auxílio que as pode socorrer.

Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem Maria - São Luis Maria Grignion de Monfort.





sábado, 8 de novembro de 2014

MARIA TEMPLO DA SANTÍSSIMA TRINDADE


Como templo da Santíssima Trindade, Maria, em sua humanidade puríssima, experimentou, como mulher, os efeitos do mistério eterno da unidade trinitária em seu seio, em sua alma, em todo o seu ser.
São Luís de Montfort afirma que “Maria é o Santuário, o repouso da Santíssima Trindade, em que Deus está mais magnífica e divinamente presente que em qualquer outro lugar do universo”. Como tabernáculo vivo da Trindade, segundo a Liturgia Oriental, suas entranhas foram feitas maiores do que o céu, porque nelas coube o próprio Deus, e com Ele o céu inteiro.
Guardadas as proporções, foi esta a grande experiência espiritual de Elisabeth da Trindade, que exclama: “Fixai-me em vós imóvel e tranqüila, como se minha alma estivesse já na eternidade. Fazei de minha alma vosso céu, vossa morada preferida”. Se Elisabeth da Trindade fez esta oração, qual não seria a oração de Nossa Senhora? Seria este o segredo, a alegria expressa no Magnificat?
Nossa Senhora foi criada para ser a morada preferida de Deus e pôde unir-se como ninguém à dinâmica de amor das três pessoas da Trindade, que, também nela, na terra como no céu, viveram e vivem sua dinâmica de dar-se e receber um ao outro absoluta e totalmente, sendo perfeitamente um só Deus. Maria foi e é, assim, templo da Unidade mais perfeita do qual jorra a fonte de toda unidade: a Santíssima Trindade, as três pessoas distintas na perfeita unicidade: um só Deus.
Maria contempla em si e diante de si o dinamismo da perfeita unidade. Que efeitos terá gerado esta vivência única em Nossa Senhora? A perfeita união com Deus; a unidade consigo mesma; e a promoção da unidade no coração do homem e na humanidade inteira.
Dom Adélio comentou rapidamente que deveríamos ver Nossa Senhora não somente como alvo de uma devoção ou um degrau para chegar a Jesus, mas como alguém efetivamente atuante na nossa Salvação.
Dom Aloísio explica como Maria foi e é efetivamente atuante no Antigo e Novo Testamento e na Igreja nascente. Ela é efetivamente atuante ainda hoje. E hoje, mais do que nunca, ela é promotora da unidade e da paz, na Igreja de seu Filho e na humanidade inteira.
Católicos, Ortodoxos, e mesmo Muçulmanos, reconhecem Maria, veneram-na e a honram, quer como a Mãe de Deus, quer como, no caso dos Muçulmanos, a única criatura além do seu Filho que não foi educada por Satanás. Em Maria, a “religio”, a religação, o relacionamento entre o céu e a terra, completa-se de modo perfeito. Ela é o “lugar teológico” por excelência da religião.
No pontificado de João Paulo II, como ele mesmo não se cansa de declarar, “a Mãe da Salvação” tem atuado de forma maravilhosa na acepção mesma do termo. Queira Deus que nós tenhamos a mesma fé e a mesma intimidade com Maria que tem o nosso Papa!
Infelizmente, de um modo geral, não temos intimidade espiritual com Maria. Ou ela é um “Modelo Moral” cujas virtudes devemos imitar, ou é alguém de quem somos devotos, a quem oferecemos rosários e novenas para que consiga de Deus as coisas para nós. Nosso coração, no entanto, deve inclinar-se para ela “pelo amor e a oração” (ECCSh), “pois o verdadeiro devoto não ama a Maria porque ela lhe faz ou espera dela algum bem, mas porque ela é amável” (São Luís Montfort).
Nossa Senhora está viva de corpo e alma no céu. Podemos e devemos alimentar nosso amor, trato de amizade e intimidade com ela. Ela levou, como Jesus ressuscitado, nossa humanidade para o céu. Como disse D. Aloísio, a Rainha do céu está muito acima, infinitamente acima, de todos os anjos e santos, à direita do Pai, na humanidade de Jesus e na sua própria humanidade. A Mãe de todos os homens está no céu em sua humanidade gloriosa como mulher. É como mulher que ela faz a mediação da unidade e a promove.
Jesus disse: o meu Pai até agora está trabalhando, e eu também estou trabalhando (Jo 5,17). Pelo Espírito Santo, que o Pai enviou, a Igreja trabalha e sofre, continuando a Obra de Cristo. Pelo Espírito Santo, Maria trabalha e sofre até agora, como sempre Virgem e Mãe de Deus, e como Mãe da Igreja e Mãe de Deus.
Seu maior trabalho, unido ao Espírito Santo e impulsionada por Ele, cuja atividade de amor ela contempla e abriga em si: que os homens se amem uns aos outros, que sejam um como o Filho e o Pai são um: na dinâmica troca gratuita e total de amor, sem impedimentos e barreiras. São Luís de Montfort afirma que “a mais forte inclinação de Maria é unir-nos ao seu Divino Filho”.
Maria trabalha pela unidade como Virgem e Mãe de Deus
 Como Virgem (antes, durante e depois do nascimento de Jesus), Maria é unificada em si mesma e é toda de Deus. Seu coração não se divide com nenhuma criatura e, de coração indiviso, une-se inteiramente a Deus, de corpo e alma. Como Virgem e Mãe de Deus sua união a Ele leva a permanecer em contínua oração e adoração da Trindade, em si, e na Trindade mesma que contempla. A Virgem e Mãe de Deus viveu perfeitamente o “Assim na terra como no céu”. Como Virgem e Mãe de Deus está na Trindade inteiramente e a Trindade inteiramente nela, sem divisões.
Maria Virgem e Mãe de Deus promove em nós, com sua mediação eficaz, sendo nossa humanidade no céu: 1- a unidade com Deus, por ser inteiramente dele; 2- a unidade consigo própria, pois esta acontece somente naquele para quem Deus é tudo e que, portanto, é todo de Deus; 3- a unidade com o irmão, pois todos os homens se tornam filhos de quem é casto. Quem é virgem, quem é casto, é também pobre de si e rico de Deus. Quem é pobre de si não tem medo de amar o outro, para ele o outro não é ameaça. Não põe barreiras ao amor de Deus, nem do irmão. Porque é todo de Deus e nada tem de si mesmo, é também todo do irmão. Em sua virgindade e castidade Maria é toda nossa.
Maria promove a unidade como Esposa e Mãe de Deus
A esponsalidade de Maria com o Pai (pela paternidade), com o Filho (pelo desponsório espiritual) e com o Espírito Santo (pela geração de Jesus) a faz, como vimos, íntima e para sempre, espiritual e humanamente, unida a cada pessoa da Trindade. Maria não se une a estas pessoas pelo que fazem nela, mas pelo que São nela. Nela Deus é Pai; nela Deus é Filho; nela Deus é Esposo; nela Deus é Uno e Trino.
Sem Maria, Deus não seria Pai, nem Filho, nem Esposo. No Antigo Testamento Deus agiu como Pai e algumas poucas vezes foi reconhecido como tal. Deus revelou-se em Israel, que o traía e adulterava. Deus prometeu o Messias. Mas somente em Maria e com Maria, Deus foi, pela união íntima com sua criatura, Pai, Filho e Esposo. Por outro lado, sem Jesus, nem Maria nem nós seríamos filhos no Filho, e chamados à união esponsal mística com Deus, Uno e Trino.
Maria, Esposa e Mãe de Deus, possibilitou assim a unidade da humanidade com cada pessoa da Santíssima Trindade. E hoje, no céu, com sua mediação, promove a unidade da humanidade e de cada homem com Deus.
Maria ministra a unidade como Mãe de Deus e Mãe da Igreja
A maternidade está intrinsecamente ligada à vida e à alegria. No entanto, está também intrinsecamente ligada à dor e à morte para si mesmo. Maria tornou-se Mãe da Igreja no auge da dor, e, portanto, no cume do amor, pois a cruz foi o auge de sua renúncia a Jesus e a si mesma.
A Jesus, ela deu a luz sem dor, mas à Igreja ela deu a luz no ápice da dor. A maternidade de Jesus foi fruto da ação do Espírito Santo em suas entranhas humanas, e, no entanto, Ele veio à luz sem dor e sem o rompimento natural do parto; a maternidade da Igreja foi fruto da ação do Espírito Santo nas entranhas do seu Espírito e, no entanto, a Igreja veio à luz em meio a maior das dores.
Maria gestou a Igreja junto com Jesus, pois nunca haverá a menor sombra de separação entre eles, seja em pensamento, sentimento, vontade ou história. Maria sempre foi profundamente unida a Jesus e gestou com seu Filho, Fundador e Cabeça da Igreja, cada discípulo, sendo presença de Mãe. Talvez não compreendesse totalmente que a maternação da Igreja supusesse a dor da morte de Jesus, que a consola entregando-a ao mais querido dos discípulos. Maria ministrou a unidade e a paz na Igreja pelo sofrimento do amor, pela renúncia do sacrifício. Jesus foi o preço desta maternidade.
Hoje, Maria promove a unidade na Igreja, a unidade entre os irmãos, seus filhos, pelo nosso amor e sacrifício unidos àquele seu lancinante sacrifício de renúncia e oferta do próprio Filho. Foi ela a primeira a completar na própria carne o que faltou ao sofrimento de Cristo em favor da sua Igreja.
Não é possível haver unidade entre nós sem grande sacrifício de sim unido ao sacrifício de Jesus e de Maria. O sacrifício de sim separado de Jesus e de Maria é estéril. Mas, unido ao sacrifício deles dois e à virgindade, esponsalidade e maternidade de Maria, é fecundo, promotor da unidade e da paz. Mergulha-nos abismos do silêncio de Deus, da obediência que tanto Jesus como Maria (como nós) aprenderam pelo sofrimento (cf. Hb 5). Mergulha-nos na unidade de quem se esquece de si mesmo para perder-se em Deus, fonte de todo bem, de toda unidade, de toda paz.
Maria promove a unidade como mulher
Não há como separar a maternidade da mulher, nem a mulher da maternidade. Na nossa caminhada para a intimidade e a amizade com Maria, devemos ter em conta que ela é mulher e que, como mulher, está ressuscitada no céu com seu corpo glorioso, mas feminino, no seu modo de ser, de pensar e de agir. Maria agiu, age e agirá sempre, no céu e na terra, segundo a mente e os sentimentos de Cristo, mas como mulher, em sua “gratuidade irradiante de mãe, na sua reciprocidade e antecipação de esposa, na sua acolhida fecunda de virgem”, como diz Bruno Fort. É, portanto, também como mulher que ela promove a unidade.
Foi como mulher que Maria reagiu ao anúncio da gravidez de Isabel indo ajudá-la imediatamente. Podemos imaginá-la feliz por vivenciar a maternidade da prima e por poder servi-la como fazem as mulheres de Deus, como fazem as mães em sua “gratuidade irradiante”.
Foi sua “lógica de mulher” que se manifestou em Caná, não só ao notar que faltava vinho, mas especialmente no modo como agiu com relação a Jesus e aos serventes. Maria foi aí “antecipação e reciprocidade”, como a esposa descrita por Bruno Fort.
Foi como mulher e Mãe de Deus que Maria foi formada pelo seu Filho no reencontro no templo e à porta da casa de Pedro. No primeiro caso, Ele lhe obedeceu e respeitou sua afeição de mãe, voltando para casa. No segundo, ela o compreendeu, em “acolhida profunda” de virgem…
Foi sua personalidade feminina e, portanto, materna que a fez ficar de pé diante da cruz, não somente pela extraordinária graça de fidelidade e fortaleza, mas pelo esforço em ficar o mais próximo possível, o mais visível possível ao Filho, a quem consolava e cuja agonia acompanhava. Foi ainda como mulher que ela abrigou-se na casa de João que, sendo discípulo amado de Jesus, era certamente também dela. Jesus sabia bem que o que faz uma mulher sentir-se segura é o amor e não a força. Foi a mulher e Mãe que manteve os discípulos unidos e reunidos à esposa do Paráclito. Ela era a mulher do Ressuscitado, a mãe do Filho de Deus, “um pedaço dele”. Foi a mulher, Mãe de Deus, que foi assunta ao céu e colocada acima de todos, abaixo somente da Trindade. É como mulher e Mãe que ela, a intercessora onipotente, trabalha até agora para promover a unidade.
Eis por que é tão grande nossa responsabilidade com relação à mulher e à mãe. Dirijo-me aos homens e às mulheres. Nós – homens e mulheres – perdemos a noção do papel da mulher com relação a Deus e à humanidade. A causa é que nos colocamos diante de nós mesmos e dos nossos anseios, e não diante de Deus e dos seus planos para nós, como homens, como mulheres, como famílias, sejam famílias religiosas ou institucionais.
Um dos principais papéis da mulher, em qualquer época da história, é, sem dúvida, ser disponível a Maria para a instauração da unidade e da paz através da sua maternidade e feminilidade. Onde a mulher não cumpre este papel, a instauração do Reino de Deus não se cumpre plenamente.
Maria “trabalha ainda hoje” pelo amor e poder de Deus que a escolheu e lhe deu uma missão que durará até a segunda vinda de Jesus. Ela, como a Esposa de Deus, no Espírito Santo, trabalha em nós, pela intimidade, amor e amizade conosco, e através de nós, que queremos responder positivamente a esta amizade.

                                                   Por Maria Emmir Oquendo Nogueira


Fonte: Comunidade Shalom

sábado, 1 de novembro de 2014

AVE MARIA



1 - HISTÓRIA DA AVE MARIA
2 - A ORAÇÃO MAIS ANTIGA FEITA A MARIA
3- ANÁLISE BÍBLICA DA AVE MARIA

3.1- A INTERCESSÃO DOS SANTOS NO ANTIGO TESTAMENTO E A NOÇÃO DE MORTE.  
3.2-O TERMO SANTO NO NOVO TESTAMENTO
3.3- AVE-MARIA PARTE POR PARTE
4- REZAR E ORAR

5- VENERAÇÃO, E NÃO ADORAÇÃO
6- TEXTOS DA AVE MARIA AO LONGO DA HISTÓRIA

1- A ORAÇÃO MAIS ANTIGA FEITA A MARIA: “À vossa proteção recorremos Santa Mãe de Deus. Não desprezeis as nossas súplicas Em nossas necessidades, Mas livrai-nos sempre de todos os perigos, Ó Virgem gloriosa e bendita!”. 
A oração “Sub tuum praesidium” (À vossa proteção) é a mais antiga oração a Nossa Senhora que se conhece. 
 Encontrada num fragmento de papiro, em 1927, no Egito, remonta ao século III. 

Tem uma excepcional importância histórica pela explícita referência ao tempo de perseguições dos cristãos (Estamos na provação e Livrai-nos de todo perigo) e uma particular importância teológica por recorrer à intercessão de Maria invocada com o título de Theotókos (Mãe de Deus).
 Este título é o mais importante e belo da Virgem Santíssima. Já no século II era dirigido a Maria e foi objeto de definição conciliar em Éfeso em 431. O texto primitivo do qual derivam as diversas variações litúrgicas (copta, grega, ambrosiana e romana) é o seguinte: Sob a asa da vossa misericórdia nós nos refugiamos, Theotókos; não recuse os nossos pedidos na necessidade e salva-nos do perigo: somente pura, somente bendita.
2- HISTÓRIA DA AVE MARIA: “A Ave-Maria traz em si a marca de muitos séculos e de muitas mãos que a compuseram um pouco por vez. A Igreja ousa repetir o texto evangélico, completando-o ou modificando-o, e imediatamente depois ( na parte da Santa Maria) manifesta a necessidade de apoiar-se em Maria nas dificuldades que encontra para ser fiel a Cristo: a figura de Maria nas catacumbas de Priscila (fim do século II) e na igreja de Santa Maria Antiqua (ambas em Roma), e a invocação gravada no muro da casa de Maria em Nazaré mostram como, desde o princípio de sua história, a Igreja aprendeu a buscar Maria ao lado de Cristo” .
Somente em 1568, portanto quinze séculos após o advento do Cristianismo, a Ave-Maria foi oficialmente aprovada pela Igreja, mas o culto e a oração a Maria existe desde os primeiros séculos e foi crescendo gradativamente, como vemos no registro encontrado no papiro do séc III. Na verdade, desde 1568, quase nada mudou no texto oficial da oração da Ave Maria. As alterações, portanto, aconteceram principalmente antes desse reconhecimento. 
A Ave-Maria se impôs ao Cristianismo como a porta de acesso à Virgem Maria, a suprema intercessora dos cristãos.  O primeiro documento escrito em que aparece o uso da saudação do anjo é a Homilia de um certo Theodoto Ancyrani, falecido antes do ano 446. Nela é explicitamente afirmado que, impelidos pelas palavras do anjo, dizemos: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo”.
Quanto à saudação de Santa Isabel, aparece ela unida à do anjo por volta do século V. As duas saudações conjugadas já se encontram nas liturgias orientais de São Tiago (em uso na Igreja de Jerusalém), de São Marcos (na Igreja Copta) e de São João Crisóstomo (na Igreja de Constantinopla). Na Igreja latina, entretanto, as referidas saudações aparecem pela primeira vez unidas aproximadamente noséculo VI, em obras de São Gregório Magno.
O nome Maria foi acrescentado às palavras do anjo, no Oriente, por volta do século V, segundo parece, na liturgia de São Basílio; no Ocidente, porém, parece que isto ocorreu aproximadamente no século VI, figurando numa das obras de São Gregório Magno, o Sacramentário Gregoriano.O nome Jesus foi acrescido às palavras de Santa Isabel provavelmente um século depois, no Oriente, figurando pela primeira vez em certo Manual dos Coptas, talvez no século VII; no Ocidente, todavia, o primeiro documento que registra o nome do Redentor é a Homilia III sobre Maria, mãe virginal,de Santo Amedeo, Bispo de Lausanne (Suíça) (aproximadamente em 1150), discípulo de São Bernardo. Nos mencionados documentos, ao nome Jesus encontra-se adicionada a palavra Christus. A segunda parte da prece (Santa Maria, etc.), a súplica, já era empregada na Ladainha dos Santos. 
Em determinado código do século XIII, da Biblioteca Nacional Florentina, que já pertencera aos Servos de Maria do Convento da Beata Maria Virgem Saudada pelo Anjo, em Florença, lê-se esta oração: “Ave dulcíssima e imaculada Virgem Maria, cheia de Graça, o Senhor é contigo, bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto de teu ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, mãe da graça e da misericórdia, rogai por nós agora e na hora da morte. Amém." Nesta fórmula, faltam somente dois vocábulos: [nós] pecadores enossa [morte]. A fórmula precisa da Ave Maria, como é rezada hoje, encontra-se pela primeira vez no século XV, no poema acróstico do Venerável Gasparini Borro, O.S.M. (+ 1498). A segunda parte da Ave Maria foi sempre rezada em caráter privado pelos fiéis até o ano de 1568, quando o Papa São Pio V promulgou o novo Breviário Romano, no qual figura a fórmula do referido Venerável Gasparini Borro, sendo estabelecida solenemente sua recitação no início do Ofício Divino, após a recitação do Pai Nosso e prescrita para todos os sacerdotes.  Depois de um século a mencionada fórmula, sancionada pelo Sumo Pontífice, difundiu-se, de fato, em toda a Igreja universal.

3- ANÁLISE BÍBLICA DA AVE MARIA:
As " Igrejas desenvolveram a oração à santa Mãe de Deus, centrando-a na Pessoa de Cristo manifestada em seus mistérios" como diz o Catecismo da Igreja Católica. A oração aos santos e a Maria é possível (Apoc 8,3-4), pois para os cristãos desde os primeiros séculos da Igreja, aqueles que morrem no Senhor vivem para o Senhor e estão diante dele na glória do céu, "Ora, Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos porque todos vivem para Ele” (Lc 20, 37-38) (Fl 1, 21, 23) (Lc 9, 28 ss), (LC 23, 42-43) e estão aguardando o desfecho final da história da humanidade (Apoc 6,9-11) . Diante de Deus, os seus santos são como os anjos no céu (Mt 22, 30), intercedendo pelos homens sem cessar (Apoc 7,13-15) (II Mac 15,12-15), por meio do único mediador da salvação, Jesus, “Porque só há um MEDIADOR” entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem” - (I Timóteo 2:5).

Esse trecho de Timóteo, mal interpretado pelos não católicos, é usado como argumento para dizer que os santos não podem interceder por nós, o que é um erro, pois o que Timóteo quer dizer é que Jesus é o mediador da salvação dos homens, porém por meio dele podemos oferecer nossas orações também (I Timóteo 2:1). Os santos podem interceder por nós, e são nossos mediadores, pois quem ora pelo outro está sendo mediador entre o outro e Deus (Dt 5, 5), (Jer 15, 1 ss).  E o próprio Timóteo diz que "Antes de tudo, pois, exorto que se use a prática de súplicas, orações e intercessões e ações de graça em favor de todos os homens"  (I Timóteo 2:1), se podemos orar em vida, também podemos orar na presença do senhor após a morte (Fl 1, 21, 23), (II Mac 15,12-15), (Lc 16, 19 e ss), (Lc 20, 37-38), (Apoc 6,9-11), (Apoc 8,3-4). Até na parábola do rico avarento, Jesus nos mostrou a possibilidade dessa intercessão (Lc 16, 19 e ss).
A mediação de Maria e dos santos é possível (II Mac 15,12-15), assim como é possível que oremos por nossos irmãos na terra(Tgo 5, 16), (I Tm 2, 1-5) .  No antigo Testamento, já vemos sinais dessa possibilidade, só completa com a redençao de Cristo e sua entrada no céu: "E o Senhor disse-me: ainda que Moisés e Samuel se pusessem diante de mim, a minha alma não se inclinaria para este povo; tira-os da minha face e retirem-se" (Jer 15, 1 ss). (Dt 5, 5): "Eu fui naquele tempo intérprete e mediador entre o Senhor e vós". "Tomai sete touros... e ide a meu servo Job... e meu servo Job orará por vós e admitirei propício a sua face" (Job 42, 8) Onias (…) estava com as mãos estendidas, INTERCEDENDO por toda a comunidade dos judeus. Apareceu a seguir um homem notável (…) Esse é aquele que MUITO ORA pelo povo e por toda cidade santa, é Jeremias, o Profeta de Deus.” (2Mac 15,12-14).

 3.1- A INTERCESSÃO DOS SANTOS NO ANTIGO TESTAMENTO E A NOÇÃO DE MORTE. 

Muitos não católicos usam passagens do Antigo testamento para afirmar que os mortos não podem orar por nós: “Os mortos não louvam ao Senhor, nem os que descem a sepultura” - Salmos 115:17. “Porque não pode louvar-te a sepultura, nem a morte glorificar-te; nem esperarão em tua verdade os que descem à cova” - Isaías 38:18.   Esquecem que a própria teologia bíblica é um processo evolucional, e que o Novo Testamento, com Cristo, rompe o que era velho, o Antigo testamento. Cristo aperfeiçoou os ensinamentos do Antigo Testamento, e abriu para nós o reino dos céus, o Paraíso ( Lc 23, 43). A noção de morte no Antigo Testamento é outra que a proposta pelos cristãos. Apesar disso, há alguns trechos que assinalam a noção de vida consciente após a morte e de intercessão deles : "E o Senhor disse-me: ainda que Moisés e Samuel se pusessem diante de mim, a minha alma não se inclinaria para este povo; tira-os da minha face e retirem-se" (Jer 15, 1 ss).  "Dá de boa vontade a todos os vivos, e não recuses este benefício a um morto" ( Eclo 7,37 ). Mas as almas dos justos estão na mão de Deus, e nenhum tormento os tocará. (Sabedoria 3,1). Em II Mac 15,12-15 lemos: "Parecia-lhe (a Judas Macabeu) que Onias, sumo sacerdote (já falecido!)... orava de mãos estendidas por todo o povo judaico... Onias apontando para ele, disse: "Este é amigo de seus irmãos e do povo de Israel; é Jeremias (falecido!), profeta de Deus, que ora muito pelo povo e por toda a cidade santa". 

 "Em seguida, fez uma coleta, enviando a Jerusalém cerca de dez mil dracmas, para que se oferecesse um sacrifício pelos pecados: belo e santo modo de agir, decorrente de sua crença na ressurreição, porque, se ele não julgasse que os mortos ressuscitariam, teria sido vão e supérfluo rezar por eles. Mas, se ele acreditava que uma bela recompensa aguarda os que morrem piedosamente, era esse um bom e religioso pensamento; eis porque ele pediu um sacrifício expiatório para que os mortos fossem livres de suas faltas" ( II Mac 12, 43-46). A morte para os cristãos é o encontro com Cristo, como nos diz São Paulo ( II Cor 5,1). Os mortos são seres conscientes para os cristãos ( I Pe 3, 18-19 ; 4, 6 ). Com a morte somos julgados imediatamente (Hb 9,27) ( RM 14,10) (II Cor 5, 10) e vamos para o céu ou para o inferno(Lc23,42), (Mt 25,34), (Mt 25,41). 
Os que ainda não estão totalmente puros ( Sl 14 ; Hb 12, 22-23 ; Mt 5,8)  para entrarem no céu, e ainda devem expiar algum pecado (I Cor 3, 10-15), (pois cada pecado tem sua consequência e Deus perdoa nosso pecado, mas devemos pagar de alguma forma pelo erro que cometemos), ficam em Purificação, o Purgatório ( Mt 12, 32), (I Cor 3, 10-15), ( II Mac 12, 43-46), ( I Cor 15,29 ) . Assim, no cristianismo, a morte é uma passagem para o céu e todos os que estão no céu podem orar pelos que estão na terra, já que "Na ressurreição, os homens não terão mulheres nem as mulheres, maridos; mas serão como os anjos de Deus no céu." (Mt 22,30).
 Apesar de ainda estarem esperando a ressurreição, os homens e mulheres justos, já estão na presença de Deus (Apoc 7,13-15) , esperando pelo desfecho final da história humana (Apoc 6,9-11) , assim , sendo como os anjos, intercedem por nós continuamente (Apoc 8,3-4) ,(Mt 18,10).

3.2 - O TERMO SANTO NO NOVO TESTAMENTO
No começo da Igreja, o termo santo era usado para todos os fiéis em Cristo: “E aconteceu que, passando Pedro por toda a parte, veio também aos santos que habitavam em Lida”- Atos 9:32“Comunicai com os santos nas suas necessidades, segui a hospitalidade” - Romanos 12:13. “Mas agora vou a Jerusalém para ministrar aos santos” - Romanos 15:25. “Paulo, apóstolo de Jesus Cristo, pela vontade de Deus, aos santos que estão em Éfeso, e fiéis em Cristo Jesus” - Efésios 1:1. “Aos santos e irmãos fiéis em Cristo, que estão em Colossos: Graça a vós, e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo” - Colossenses 1:2. “Amados, procurando eu escrever-vos com toda a diligência acerca da salvação comum, tive por necessidade escrever-vos, e exortar-vos a batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos” - Judas 1:13.
Porém, com o tempo, principalmente com as perseguições aos Cristãos em Roma, nos primeiros séculos, que colocou muitos em provação, o termo santo passou a ser um título de honra, aos que perseveravam na fé e davam seu testemunho, aceitando a morte sem negar o Cristo. Assim, os cristãos entenderam que ser santo, não é apenas ser batizado e sim perseverar na fé, dando testemunho, como nos diz a própria escritura: "Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus (Mt 7,21). Direis então: Comemos e bebemos contigo e tu ensinaste em nossas praças. Ele, porém, vos dirá: Não sei de onde sois; apartai-vos de mim todos vós que sois malfeitores. (Lc 13, 26-27). O servo que, apesar de conhecer a vontade de seu senhor, nada preparou e lhe desobedeceu será açoitado com numerosos golpes. Mas aquele que, ignorando a vontade de seu senhor, fizer coisas repreensíveis será açoitado com poucos golpes. Porque, a quem muito se deu, muito se exigirá. Quanto mais se confiar a alguém mais se há de exigir." ( Lc 12, 45-48). O dia ( do julgamento ) demonstrá-lo-á. Será descoberto pelo fogo; o fogo provará o que vale o trabalho de cada um. Se a construção resistir, o construtor receberá a recompensa. Se pegar fogo, arcará com os danos. Ele será salvo, porém passando de alguma maneira através do fogo" ( I Cor 3, 13-15). Assim, a morte é o ponto decisivo , nesse momento comparecemos diante de Deus (Hb 9,27) ( Rm 14,10) (II Cor 5, 10)e recebemos o que fizemos em vida ( II Cor 5,10), se fizemos o bem vamos para o céu (Lc23,42), (Mt 25,34), se o mal para o inferno (Mt 25,41). Quando morremos, se formos bons, vamos imediatamente para o céu (Lc 23,43) , ( II Cor 5,1), por isso muitos santos desejavam a morte como um encontro com Cristo ( II Cor 5,8). Logo, após a morte é que podemos afirmar de fato se uma pessoa foi santa de verdade ou não, pois é depois que alguém morre que descobrimos toda a verdade sobre a vida dela. Assim, com o tempo, o termo santo se tornou um título dado aos que vivem sua fé com heroísmo, evitando o pecado, praticando o Evangelho, sendo um exemplo para os demais cristãos.

3.3- AVE-MARIA PARTE POR PARTE
Assim, sendo respalda na tradição e na Bíblia, a oração a Maria encontrou uma expressão privilegiada na oração da Ave-Maria: Oração privilegiada por ser em parte bíblica e em parte fruto da tradição, assim uniu os dois pilares da nossa Igreja, com a aprovação do magistério (Papa e bispos em concílio), outro pilar.

1- "Ave, Maria (alegra-te, Maria)." (Lc1,28).

A saudação do anjo Gabriel abre a oração da Ave-Maria.
 É o próprio Deus que, por intermédio de seu anjo, saúda Maria. 
Nossa oração ousa retomar a saudação de Maria com o olhar que Deus lançou sobre sua humilde serva, alegrando-nos com a mesma alegria que Deus encontra nela.
Alguns usam Salve Maria em muitas orações, pois acham errado dizer Ave, pois era uma saudação romana, mas  quando a Bíblia foi traduzida para o latim, São Jerônimo utilizou a forma romana.
Dizer Ave ou Salve, hoje , para nós não há muita diferença, já que são saudações que caíram em desuso, porém por séculos a oração ficou conhecida como Ave Maria.


2- "Cheia de graça, o Senhor é convosco." (Lc1,28). As duas palavras de saudação do anjo se esclarecem mutuamente. Maria é cheia de graça porque o Senhor está com ela.  A graça com que ela é cumulada é a presença daquele que é a fonte de toda graça.
 "Alegra-te, filha de Jerusalém... o Senhor está no meio de ti" (Sf 3,14.17a). Maria, em quem vem habitar o próprio Senhor, é em pessoa a filha de Sião, a Arca da Aliança, o lugar onde reside a glória do Senhor: ela é "a morada de Deus entre os homens" (Apoc 21,3).  "Cheia de graça", e toda dedicada àquele que nela vem habitar e que ela vai dar ao mundo.


3- "Bendita sois vós entre as mulheres, e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus." (Lc1,41). Depois da saudação do anjo, tornamos nossa a palavra de Isabel. "Repleta do Espírito Santo" (Lc 1,41), Isabel é a primeira na longa série das gerações que declaram Maria bem-aventurada': "Feliz aquela que creu..." (Lc 1,45): Maria é "bendita entre as mulheres" porque acreditou na realização da palavra do Senhor. Abraão, por sua fé, se tomou uma bênção para "todas as nações da terra" (Gn 12,3).  Por sua fé, Maria se tomou a mãe dos que creem (Apoc12,17) (Jo 19, 26-27), porque, graças a ela, todas as nações da terra recebem Aquele que é a própria bênção de Deus: "Bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus".

4-  "Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós..." 

Com Isabel também nós nos admiramos: "Donde me vem que a mãe de meu Senhor me visite?" (Lc 1,43). Porque nos dá Jesus, seu filho, Maria é Mãe de Deus e nossa Mãe; podemos lhe confiar todos os nossos cuidados e pedidos: ela reza por nós como rezou por si mesma: "Faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1,38). Confiando-nos à sua oração, abandonamo-nos com ela à vontade de Deus: "Seja feita a vossa vontade".
 Maria é Mãe de Deus, pois foi de Maria que nasceu Jesus (Mt 1, 16) (Gal 4,4) , o nosso Senhor (Lc1,43), Filho de Deus (Lc1,35) eDeus (Jo 1,1), (Jo 5,18) com o Pai e o Espírito Santo (Mt 28,19). Maria é Mãe de Deus, pois Jesus não é metade homem e metade Deus, Ele é Deus e homem ao mesmo tempo. Maria é Mãe no sentido de ter gerado em seu ventre e em seu coração Jesus, nosso Senhor e Deus.  


5- "Rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte". Já foi explicado mais acima a intercessão dos santos na Bíblia. Assim, pedindo a Maria que reze por nós, reconhecemo-nos como pobres pecadores e nos dirigimos à "Mãe de misericórdia"  ( Jo 2,3),  à Toda Santa (Lc 1,28).  Entregamo-nos a ela "agora", no hoje de nossas vidas. E nossa confiança aumenta para desde já entregar em suas mãos "a hora de nossa morte", pois nessa hora compareceremos diante de Deus (Hb 9, 27) para sermos julgados. Que ela esteja então presente, como na morte na Cruz de seu Filho, e que na hora de nossa passagem ela nos acolha como nossa Mãe (Jo 19,27) , para nos conduzir a seu Filho, Jesus, no Paraíso, pois o seu pedido é poderoso (Jo 2, 3ss).


4 - REZAR E ORAR

A piedade medieval do Ocidente desenvolveu a oração do Rosário como alternativa popular à Oração das Horas. O rosário é uma oração vocal, resumo do Evangelho, pois medita toda a vida de Jesus e Maria, seus mistérios gozosos, dolorosos, luminosos e gloriosos. Rezar o rosário é rezar a Bíblia, pois ele é composto, quase que completamente de orações evangélicas o Pai-nosso (Mt 6,9-13), a Ave Maria ( Lc 1,28. 42.) e o Glória ao Pai (Lc 2, 14). Rezar , do latim recitare, que também deu em português recitar. Já em latim, os verbos orare recitare têm sentidos muito próximos: o primeiro significa “pronunciar uma fórmula ritual, uma oração, uma defesa em juízo”; o segundo, “ler em voz alta e clara”(portanto, o mesmo que em português recitar). Entretanto, para orare prevaleceu na latinidade e nas línguas românicas o sentido de rezar, isto é, dizer ou fazer uma oração ou súplica religiosa (cfr. A. Ernout–A. Meillet, Dictionnaire étymologique de la langue latine — Histoire des mots, Klincksieck, Paris, 4ª ed., 1979, p. 469). 

Nós, católicos, damos ao verbo rezar um sentido bastante amplo e genérico, e reservamos a palavra oração mais especialmente — mas não exclusivamente — para os diversos gêneros de oração mental, como a meditação, a contemplação etc. Não há razão, portanto, para fazer dessa ligeira diferença, comum nos sinônimos, um tema de disputas. Alguns não católicos dizem que “não devemos orar repetidas vezes”, e apelam para a Bíblia, a passagem do  Evangelho de São Mateus (6,7): “Nas vossas orações, não queirais usar muitas palavras, como os pagãos, pois julgam que, pelo seu muito falar, serão ouvidos”. A interpretação deste texto de São Mateus não é, entretanto a que os protestantes lhe dão. 
Ele significa simplesmente que a eficácia da oração não decorre da loquacidade ( palavras bonitas para convencer a Deus), mas sobretudo das boas disposições do coração. As disposições sendo boas, em princípio, quanto mais se reza melhor! Até porque rezar é repetir uma fórmula, mas o que muda é o porque se reza, como se reza, com que intenção, com que desejo, com que pensamento. Além do mais, como judeu, Jesus aprendeu a rezar muitos salmos (Mt 26,30), e participou de muitas cerimônias judaicas e no Evangelho não consta que Ele fosse contra elas, muito pelo o contrário ele mesmo frequentava o Templo de Jerusalém. Os próprios não católicos quando cantam um hino  estão rezando, pois ninguém inventa uma canção do nada. E o próprio Jesus Cristo, Nosso Senhor, deu o exemplo de uma oração longa e repetitiva no Horto das Oliveiras, quando, prostrado com o rosto em terra, rezou por mais de uma hora, dizendo:  "Pai, se é possível, afaste-se de mim este cálice; mas não se faça a minha vontade, e sim a vossa." ( Mt 26, 39-44; Lc 22, 41-45). Jesus orou por três vezes com as memas palavras, usando uma fórmula, porém o que contava era a intensidade com que ele dizia essas palavras: "Deixou-os e foi orar pela terceira vez, dizendo as mesmas palavras " (Mt 26,44). Quanto à necessidade da insistência na oração, no Evangelho de São Lucas (11, 5-8) se lê a impressionante lição do Divino Mestre: “Se algum de vós tiver um amigo, e for ter com ele à meia-noite, e lhe disser: Amigo, empresta-me três pães, porque um meu amigo acaba de chegar a minha casa de viagem, e não tenho nada que lhe dar; e ele, respondendo lá de dentro, disser: Não me sejas importuno, a porta já está fechada, e os meus filhos estão deitados comigo; não me posso levantar para te dar coisa alguma. E, se o outro perseverar em bater, digo-vos que, ainda que ele se não levantasse a dar-lhos por ser seu amigo, certamente pela sua importunação se levantará, e lhe dará quantos pães precisar”. A reiteração de nossos pedidos a Deus deve pois chegar a esse ponto da importunação, segundo o conselho do mesmo Nosso Senhor.  Maria é orante perfeita, figura da Igreja (Apoc 12). Quando rezamos a ela, aderimos com ela ao plano do Pai  (Lc 1,38), que envia seu Filho para salvar todos os homens. Como o discípulo bem-amado, acolhemos em nossa casa a Mãe de Jesus (Jo 19,27), que se tornou a mãe de todos os vivospois se em Eva, somos filhos do pecado ( Gn 3,20), (Rm 5,12), em Cristo, recebemos vida nova ( Rm 5,19) e Maria é a mãe dessa nova geração de redimidos ( Apoc 12,17). Podemos rezar com ela e a ela.  A oração da Igreja é acompanhada pela oração de Maria, que lhe está unida na esperança.

5- VENERAÇÃO E NÃO ADORAÇÃO 
"Todas as gerações me chamarão bem-aventurada" (Lc 1,48): "A piedade da Igreja para com a Santíssima Virgem é intrínseca ao culto cristão". A Santíssima Virgem "é legitimamente honrada com um culto especial pela Igreja. Com efeito desde remotíssimos tempos, a bem-aventurada Virgem évenerada sob o título de 'Mãe de Deus', sob cuja proteção os fiéis se refugiam suplicantes em todos os seus perigos e necessidades (...) 
Este culto (...) embora inteiramente singulardifere essencialmente do culto de adoração que se presta ao Verbo encanado e igualmente ao Pai e ao Espírito Santo, mas o favorece poderosamente"; este culto encontra sua expressão nas festas litúrgicas dedicadas à Mãe de Deus e na oração Mariana, tal como o Santo Rosário, "resumo de todo o Evangelho.
Ao cultuar  Maria, podemos nos ajoelhar e rezar a ela, pois ajoelhar-se nem sempre quer dizer adorar, mas venerar, mostrar respeito, como vemos o gesto de Abigail diante de Davi: "QUANDO ABIGAIL AVISTOU DAVI, DESCEU PRONTAMENTE DO JUMENTO E PROSTROU-SE COM O ROSTO POR TERRA DIANTE DELE" I SM 25,23. Os Judeus tinham uma veneração pela Arca da Aliança (I Cron 15,28), pois sabiam que nela estava a Palavra de Deus, os dez mandamentos, e um pouco do maná, pão do céu (Hb 9,4) , e consideravam a Arca como um ponto de ligação entre eles e Deus (EX. 25, 18-22), (II Cron 6,41). Do mesmo modo, veneravam o Templo de Jerusalém (I Re 8, 10-11). Ora, Maria, para os cristãos, é a Arca da nova Aliança (Apoc 11,19), já que teve em seu ventre o Verbo (Jo 1, 1), a Palavra de Deus, e o Maná, o Pão vivo (Jo 6,35), Jesus, descido do céu (Jo 6,38), e como não devemos venerá-la? Maria foi e é o Templo perfeito da Trindade (Lc1,35) e como não respeitá-la e amá-la? Os judeus veneravam uma caixa de madeira revestida de ouro (Hb 9,4), (II Cron 6,41) que continha as tábuas da Lei, nós veneramos Maria, que conteve o Criador do Universo, que deu sua carne e seu sangue, para o Todo-Poderoso. Se os judeus tremiam e temiam o poder da Arca (Num 10,35), quanto mais nós não devemos venerar e honrar uma mulher revestida do poder de Deus (Lc1,35), (Lc1,41), (Apo 12 1-2)? Nenhuma mulher será igual a Maria, pois nenhuma será como ela, Filha, Mãe e Esposa de Deus (Lc1,35). Assim ao olhar as imagens (Num 21 8-9) de Maria e orarmos diante delas, nos dirigimos não à imagem e sim àquela que a imagem representa, assim como os israelitas oravam a Deus diante da Arca (Num 7,89), que tinha imagens de anjos ( querubins) (Ex 25,18-22) e oraram diante da serpente de bronze (Num 21 8-9).

6- TEXTOS DA AVE MARIA AO LONGO DA HISTÓRIA 
Há diversas versões e diversas variações da "Ave Maria", principalmente quando associada à arte multimídia, e mesmo em um contexto religioso formal ela não é única.

Versão Bizantina
É a versão mais antiga conhecida, rementendo a alusões do Novo Testamento.
Θεοτόκε Παρθένε, χαῖρε, κεχαριτωμένη Μαρία, ὁ Κύριος μετὰ σοῦ. εὐλογημένη σὺ ἐν γυναιξί, καὶ εὐλογημένος ὁ καρπὸς τῆς κοιλίας σου, ὅτι Σωτήρα ἔτεκες τῶν ψυχῶν ἡμῶν. Theotokos virgem, regozija, Maria cheia em graça, o Senhor é contigo. Bendita és entre as mulheres e bendito é o fruto de teu ventre, pois portas o Salvador de nossas almas.

Versão Católica pré-Tridentina
É a versão latina predominante antes do Concílio de Trento. É a forma ainda mantida por luteranos e anglicanos.
Ave Maria, gratia plena, Dominus tecum. Benedicta tu in muliuribus, et benedíctus frictus ventris tui, Iésus Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco. Bendita sois vós entre as mulheres, e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.

Versão Católico Romana pós-Tridentina
Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco. Bendita sois vós entre as mulheres, e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém.

Em latim
Ave Maria Gratia plena Dominus tecum Benedicta tu In mulieribus Et benedictus Fructus Ventris tui, Jesu Sancta Maria, Mater Dei, Ora pro nobis peccatoribus Nunc et in hora mortis nostrae Amen.

FONTES: