A palavra “ladainha” vem do grego e significa “súplica”. Mas
desde o início da Igreja ela foi utilizada para indicar não quaisquer súplicas,
mas as que eram rezadas em conjunto pelos fiéis que iam em procissão às
diversas igrejas. Há, naturalmente, numerosas ladainhas, dependendo do que é
pedido nas diversas procissões.
Quando a casa na qual morou Nossa Senhora na Palestina foi
transportada milagrosamente para a cidade de Loreto (Itália), em 1291, a feliz
novidade espalhou-se rapidamente, dando início a numerosas peregrinações. Com o
correr do tempo, uma série de súplicas a Nossa Senhora foi sendo composta pelos
peregrinos que ali iam, os quais A invocavam por seus principais títulos de
glória. Posteriormente essa ladainha era cantada diariamente no Santuário, e os
peregrinos que de lá voltavam a popularizaram em todo o orbe católico. Chama-se
“lauretana” por ter sua origem em Loreto.
Algumas invocações têm sido acrescentadas pelos Papas ao
longo dos tempos, outras são agregadas para honrar a proteção de Nossa Senhora
a alguma Ordem religiosa, como fazem os carmelitas, os quais rezam a ladainha
“lauretana-carmelitana”, com quatro invocações a mais. Mas o corpo central das
ladainhas permanece o mesmo.
A Ladainha Lauretana ou Ladainha da Santíssima Virgem foi
composta quando há pouco se encerrava a Idade Média. Guarda esse nome devido à
aprovação do Papa Sixto V, no ano de 1587, dada à ladainha habitualmente
utilizada pelos fiéis que frequentavam a Santa Casa de Loreto. Com essa
aprovação, as demais ladainhas acabaram por ser suprimidas. Alguns dos títulos
que constam atualmente foram acrescentados solenemente à ladainha original por
uma série de Papas ao longo da história.
A Ladainha da Santíssima
Virgem segue a seguinte estrutura:
Maria, a santa: Primeira parte é composta por três
avocações* que destacam: a santidade de Maria como pessoa, seu papel como Mãe
(genitora) de Jesus Cristo e sua vocação como virgem.
Maria, a mãe:
Segunda parte composta por doze avocações referentes à maternidade de Maria.
Maria, a virgem:
Terceira parte formada por seis títulos honra Maria como virgem, tratando não
só de seus méritos como tal, mas também da eficácia de sua virgindade.
Símbolos de Maria:
Depois se seguem treze avocações simbólicas, em sua maioria retirados do Antigo
Testamento, e referentes a Nossa Senhora, evidenciando suas virtudes e seu
papel como corredentora da humanidade.
Maria, a
Intercessora: Os quatros títulos seguintes exaltam o papel de Maria como
intercessora nas obras de misericórdia espirituais e corporais.
Maria, a Rainha:
E no último trecho da ladainha exaltamos por meio de treze títulos Maria como
Rainha.
Composição da
Ladainha
No início da Ladainha Lauretana, as invocações não se dirigem
a Nossa Senhora, mas a Nosso Senhor e à Santíssima Trindade, pois dizemos
Senhor, tende piedade de nós, Jesus Cristo, ouvi-nos, etc. Depois invocamos o
Padre Eterno, o Filho e o Espírito Santo.
Por quê?
Tudo em Nossa Senhora nos conduz a seu divino Filho, e por
meio d'Ele à Santíssima Trindade, que é nosso fim último. Isto é algo que os
protestantes não entendem ou não querem entender: Maria Santíssima é o melhor
caminho para se chegar a Deus.
Após essa introdução da ladainha, seguem-se três invocações,
nas quais pronunciamos o nome da Virgem (Santa Maria) e lembramos dois de seus principais privilégios: o ser Mãe de
Deus e Virgem das virgens. A seguir, há um grupo de 13 invocações para honrarmos a Maternidade de Nossa Senhora, e outras seis para honrar sua Virgindade.
Em seguida, 13 figuras simbólicas; quatro invocações de sua misericórdia
e, finalmente, 12 invocações d'Ela
enquanto Rainha gloriosa e poderosa.
Em geral, é no grupo das 13 invocações com figuras
simbólicas que surgem as maiores dificuldades de compreensão. Nossa civilização
fechou-se para o simbolismo, e aquilo que poderia ser até evidente em outras
épocas, hoje ficou obscurecido pelo exclusivismo concedido ao espírito prático.
A própria vida contemporânea contribui para isto. Assim, por exemplo, como
explicar ou ressaltar, a pessoas que ficam fechadas em cidades feias e
perigosas, a beleza de uma estrela? Igualmente, o ritmo de vida corrida e
excitante de hoje não favorece a meditação ou a contemplação das maravilhas da
criação.
Vejamos então o
significado destas 13 invocações simbólicas.
Espelho de Justiça —
Justiça, aqui, entende-se em seu sentido mais amplo de santidade. Nossa Senhora
é chamada assim, porque Ela é um espelho da perfeição cristã. Toda perfeição
pode ser admirada nEla, do mesmo modo como podemos admirar uma luz refletida na
água.
Sede da Sabedoria
— Nosso Senhor Jesus Cristo é a Sabedoria, pois, enquanto Deus, tudo sabe e
tudo conhece. Ora, Nossa Senhora durante nove meses encerrou dentro de si seu
divino Filho; Ela foi, portanto, a sede da Sabedoria. E continua a sê-lo, pois
é nEla que encontramos infalivelmente a Nosso Senhor.
Causa de Nossa
Alegria — a verdadeira alegria não é o riso. Rir muito nem sempre significa
felicidade. É muito mais feliz a mãe carregando amorosamente seu filho do que
um papalvo que ri à-toa. E a maior alegria que um homem pode ter é a de
salvar-se e estar com Deus por toda a eternidade. Ora, antes da vinda de Nosso
Senhor, o Céu estava fechado para nós. Foi o sacrifício do Calvário que nos
reconciliou com o Criador e nos proporcionou a verdadeira e eterna felicidade.
Como foi por meio de Nossa Senhora que o Redentor da humanidade veio à Terra,
Maria Santíssima é, pois, a causa de nossa maior alegria.
Vaso Espiritual —
Nada tem mais valor do que a verdadeira Fé. Na Paixão e Morte de Nosso Senhor,
quando até os Apóstolos duvidaram e fugiram, foi Nossa Senhora quem recolheu e
guardou, como num vaso sagrado, o tesouro da Fé inabalável.
Vaso Honorífico —
Em nossa época, a honra quase não é considerada. Pelo contrário, muitas vezes a
falta de caráter e a sem-vergonhice são louvadas. Mas a honra e a glória, na
realidade, valem muito. E Nossa Senhora guardou cuidadosamente em sua alma
todas a graças recebidas, e manteve a honra do gênero humano decaído. Se não
tivesse existido Nossa Senhora, ficaria faltando na criação quem representasse
a perfeição da criatura, fiel até o extremo heroísmo.
Vaso Insigne de
Devoção — Devoto quer dizer dedicado a Deus. A criatura que mais se dedicou
e viveu em função de Deus foi Nossa Senhora, tendo-o realizado de forma tal,
que melhor é impossível.
Rosa Mística — A
rosa é a rainha das flores. É aquela que possui de forma mais definida e
esplêndida tudo quanto carateriza uma flor. Igualmente Nossa Senhora, no campo
da vida espiritual ou mística, possui de forma mais primorosa tudo aquilo que
representa a perfeição.
Torre de Davi —
Lemos na Sagrada Escritura que o rei Davi tomou a fortaleza de Jerusalém dos
jebuseus e edificou a cidade em torno dela. "E Davi habitou a fortaleza, e
por isso se chamou cidade de Davi" (Paralipômenos, 11-7). Naturalmente, o
rei Davi fortificou a cidade, para torná-la inexpugnável, e a dotou de forte
guarnição. A Igreja Católica é a nova Jerusalém, e nela temos uma torre ou fortaleza
que nenhum inimigo pode invadir ou destruir, que é Nossa Senhora. Ela constitui
o ponto de maior resistência e melhor defesa. Por isso, nesta invocação
honramos a Nossa Senhora reconhecendo que nunca houve, nem haverá, quem melhor
proteja os fiéis e defenda a honra de Deus do que Ela.
Torre de Marfim —
O marfim é um material que tem caraterísticas raras na natureza. Ele é ao mesmo
tempo muito forte e muito claro. Igualmente Nossa Senhora é muito forte
espiritualmente, a maior inimiga dos inimigos de Deus, e de uma pureza
alvíssima. Assim Ela contraria a ideia falsa de que as coisas de Deus devam ser
sempre muito doces, suaves e fracas, ou que a verdadeira força têm-na os
impuros.
Casa de Ouro — O
ouro é o mais nobre dos metais. Por isso, sempre que desejamos dar alguma coisa
que seja insuperável, a oferecemos em ouro — uma medalha de ouro numa
competição, por exemplo. Se tivéssemos que receber o próprio Deus,
procuraríamos fazê-lo numa casa que não fosse superável, neste sentido uma casa
de ouro. E a Virgem Santíssima é a casa de ouro que acolheu Nosso Senhor quando
veio ao mundo.
Arca da Aliança —
No Antigo Testamento, na Arca da Aliança ficavam guardadas as tábuas da lei
dadas por Deus a Moisés e um punhado do maná recebido milagrosamente no
deserto. Por isso ela lembrava as promessas e a proteção de Deus. Nossa Senhora
é, no Novo Testamento, a Arca da Aliança que protege o povo eleito da Igreja
Católica e lembra as infinitas misericórdias de Deus.
Porta do Céu —
Nossa Senhora é invocada desse modo, pois foi por meio dEla que Jesus Cristo
veio à Terra, e é por Ela que nos vêm todas as graças, as quais têm como
finalidade nos levar ao Céu, nossa morada eterna. Assim, Ela favorece nossa
entrada no Céu, como a porta favorece a entrada num local.
Estrela da Manhã
— Pouco antes de nascer o sol, quando a escuridão é maior e vai começar a
clarear, aparece no horizonte uma estrela de maior luminosidade. Depois, quando
as outras estrelas desaparecem na claridade nascente, ela ainda permanece.
Assim foi Nossa Senhora, pois seu nascimento significava que logo nasceria o
Sol de Justiça, Nosso Senhor Jesus Cristo. E quando a Fé se perdia até entre o
povo eleito, Ela continuava a acreditar e esperar. Ela é o modelo da
perseverança na provação e o anúncio da Luz que virá.
Temos assim, resumidamente, algumas explicações das
invocações da Ladainha Lauretana. Esperemos que a compreensão delas nos ajude a
rezar com maior fervor tão meritória oração.
1- Damino, André, in “Na escola de Maria”, Ed. Paulinas, 4ª
edição, São Paulo, 1962.
*- s.f. Ação ou efeito de avocar. Chamamento da causa a
outro juízo.
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